Brites, Geraldino da Silva Baltazar

Paranhos, Porto, 25 de julho de 1882 – Lisboa, 23 de agosto de 1941

Palavras-chave: Faculdade de Medicina de Coimbra; Faculdade de Medicina de Lisboa; Anatomia; Histologia; Fisiologia; Embriologia.

DOI: https://doi.org/10.58277/HGLJ3939

Geraldino da Silva Baltazar Brites, médico, professor e investigador nas faculdades de medicina de Coimbra e Lisboa, era filho primogénito de Joaquim da Silva Baltazar Brites (pequeno proprietário e comerciante, natural de Ermesinde) e de Emília Maria de Sousa Brites, nascida no Brasil, Rio de Janeiro. Era irmão de Lusitano da Silva Baltazar Brites, advogado, e de Eurico da Silva Baltazar Brites, major de infantaria. Iniciou os seus estudos no Porto, embora os tenha concluído, em 1899, no Colégio Mondego, situado no Pátio da Inquisição, em Coimbra. Terminados os estudos preparatórios de medicina (de filosofia e matemática) iniciou o curso médico na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, em 1902. O seu percurso académico valeu-lhe menções públicas e, em 1902, foi agraciado com o Prémio Barão Castelo de Paiva pelo trabalho intitulado “artérias e veias da cabeça”, distinção que viria a receber em outras duas ocasiões, em 1904 e 1905. Casou, na Igreja de Santo António dos Olivais (Coimbra), no fim do seu segundo ano médico, a 31 de agosto de 1904, com Maria do Carmo do Nascimento, filha ilegítima do médico, deputado e senador republicano Sebastião Peres Rodrigues. Publicou, no ano seguinte, o seu primeiro trabalho científico, celebrando a ocasião no seu diário: “15 de agosto (1905) – Publicação do 1-º trabalho: Exaltação de virulência do estreptococo. Movimento Médico. 5.º ano. N.º 16”. Este artigo marcou o início de uma intensa atividade científica que contou com mais de 230 publicações, científicas e periódicas, com maior incidência entre os anos de 1929 e 1932. A 4 de novembro de 1907, terminou o bacharelato em Medicina com a classificação final de 17 valores. 

Ao longo da sua carreira exerceu diversas funções. De 1908 a 1910, foi médico municipal, em Loulé, tendo cessado funções no início desse ano para ocupar o lugar de naturalista adjunto do Museu Zoológico da Universidade de Coimbra. Em 1911, tornou-se Secretário da Morgue da 3.ª Circunscrição Médico-Legal (Coimbra) e editor da revista Movimento Médico – Revista Quinzenal de Medicina e Cirurgia. Realizou no mesmo ano um estágio no laboratório de Santiago Ramón y Cajal, para adquirir “aperfeiçoamento técnico” na fisiologia e histologia experimentais.

 Em 1912, iniciou funções como 1.º assistente provisório de 2.ª classe de Histologia e Fisiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e 1.º assistente do Laboratório de Histologia e Embriologia. Em 1915, já em Lisboa, tornou-se chefe do Laboratório da cadeira de Terapêutica Cirúrgica na Faculdade de Medicina. Em janeiro de 1919, como chefe do serviço de Tanatologia do Instituto de Medicina Legal, foi um dos especialistas presentes na autópsia ao cadáver do Presidente da República Portuguesa, Sidónio Pais, assassinado no Rossio, a 14 de dezembro de 1918. 

Adquiriu formação científica em diferentes laboratórios e institutos com colegas como Francisco Gentil, Enrico Franco e Azevedo Neves, aí encontrando fundamento para a criação do núcleo de Histologia e Embriologia de Coimbra, anos mais tarde.

Em 1922, e após ser nomeado professor ordinário de Histologia e Embriologia da Faculdade de Medicina de Lisboa, regressou a Coimbra, construindo, daí em diante, uma carreira académica e científica, de mérito. Em 1926, atingiu o topo da carreira universitária ao passar à categoria de professor catedrático convidado e, logo depois, passou a exercer o cargo de diretor do Instituto de Histologia e Embriologia, continuando, dessa forma, o trabalho desenvolvido por um dos seus mestres, Augusto Costa Simões. Foi um dos cofundadores, ainda no ano de 1926, da revista Folia Anatomica Universitatis Conimbrigensis e foi membro da Comissão Portuguesa da União lnternacional das Ciências Biológicas. 

Tornou-se defensor da investigação científica na formação médica, integrando a elite médica republicana da época. Personalidades que, como ele, defendiam um ensino baseado na observação e na experimentação médica e rejeitavam o espírito “fradesco” e tradicionalista que predominava na universidade portuguesa, conduziram às sucessivas reformas do ensino médico em Portugal, a partir de 1911. Por esta razão, Geraldino foi também um alvo predileto da polícia política, e também, dos setores mais conservadores e tradicionalistas do regime, como foi o caso da Igreja Católica. Republicano convicto faleceu em Lisboa, a 23 de agosto de 1941, sendo sepultado no cemitério do Alto de São João. 

Publicou sobre temas de anatomopatologia, histologia, ciências biológicas e ensino médico, participou em diversas conferências nacionais e internacionais apresentando os seus trabalhos e foi responsável, juntamente com outros colegas como Augusto Costa Simões, Maximino Correia, Basílio Freire e Carlos França, pela abertura da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, ao estrangeiro. Neste contexto, promoveu intercâmbios e encontros científicos, financiados, em alguns casos pela Junta de Educação Nacional (JEN). Também ele usufruiu do apoio da JEN, nomeadamente através de várias bolsas de investigação que lhe foram concedidas, entre 1929 e 1935. 

Para Geraldino, a defesa do progresso médico em Portugal passava pelo incentivo às publicações científicas pela comunidade médica, bem como, pelo apetrechamento das bibliotecas médicas, de obras e revistas científicas nacionais e internacionais nas diferentes áreas do ensino e da prática médica, que serviriam de suporte à formação médica. Defendeu a importação de modelos de ensino médico existentes em outras faculdades, como na Faculdade de Medicina de Bruxelas, onde se organizavam os espaços laboratoriais em espaços comuns, de forma a privilegiar a partilha de saberes, de pessoal técnico e do material de equipamento laboratorial indispensável ao ensino, como os microscópios. 

Em defesa dos valores republicanos que perfilhava, não se isentava de intervir publicamente em assuntos relacionados com o ensino religioso e com a laicização do poder político, revelando uma faceta de intelectual público. Em 1926, e devido ao seu posicionamento republicano envolveu-se numa polémica cultural e religiosa (mas também político-ideológica) com Manuel Gonçalves Cerejeira, à época docente da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. O ideário republicano norteou toda a sua vida sociopolítica e, por essa razão, foi perseguido pela polícia política que o considerava como “reviralhista de categoria, pessoa com rancor ao Estado Novo”. 

Foi uma figura marcante do panorama médico nacional da primeira metade do século XX. Recordado pela sua neta, Maria Luís Roldão Brites (1934-2023), como um homem de semblante calmo e atencioso, viveu uma vida dedicada à investigação científica, sem nunca descurar a família. Geraldino Brites foi um médico-investigador, um humanista, um democrata, um liberal e, acima de tudo, um homem que dedicou a sua vida ao progresso da medicina nacional. O seu nome encontra-se inscrito na toponímia de Loulé. 

Carolina Henriques Pereira

Professora Auxiliar convidada na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e Investigadora Integrada do Centro de História da Sociedade e da Cultura (CHSC-FLUC)

Arquivo 

Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC), Matrículas, Livro 122, fl. 272v; Anatomia Descritiva, Matrícula I, fl. 5; Medicina, Graus I, Livro 24 (1907-1908), fl. 9 e Registos Paroquiais, Casamentos, Paróquia de Santo António dos Olivais (Coimbra), nº 33 (31 de agosto de 1904). 

Coimbra, Arquivo do Instituto de Histologia e Embriologia (FMUC), diário de Geraldino Brites.

Coimbra, Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra (BGUC), Periódicos Provincia do Algarve (1908); A Batalha (1925); O Mundo (1926); Correio de Coimbra (1926); Gente Nova (1928); O Século (1941) e Diário de Coimbra (1982).

Lisboa, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo da PIDE/DGS, SC, Cadastro 962 e n.º 13769, NT 4621, 1939.

Lisboa, Arquivo de Ciência e Tecnologia (ACT) (https://arquivo.fct.pt) – Arquivo Augusto Pires Celestino da Costa, Relação de Bolseiros (1929-1937) e Pareceres de Celestino da Costa (Livro 2, n.º 1472, julho de 1934).

Lisboa, Centro de Documentação da Polícia Judiciária (CDPJ), Fundo Varatojo, Asdrúbal António D’Aguiar, “Exames periciaes no cadaver do Presidente da República Dr. Sidonio Paes, no vestuario e na arma agressora”, Separata dos Archivos do Instituto de Medicina Legal de Lisboa, B, V (1921).

Pombal, Arquivo Pessoal de Maria Luís Roldão Brites Bustorff

Obras

Brites, Geraldino. Clima do Algarve: o inverno. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1916.

Brites, Geraldino. Diverticules du duodénum: étude anatomo-pathologique de huit cas. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1927.

Brites, Geraldino. Ulcères gastro-duodénaux détermines par des infarctus emboliques. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1929.

Brites, Geraldino. O médico e o ambiente social. Coimbra: Instituto de Estudos Livres, 1933.

Brites, Geraldino. Questões de ensino. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1934.

Brites, Geraldino. Ramón y Cajal, investigador e educador. Madrid: C. Bermejo, 1936.

Bibliografia sobre o biografado

Correia, Maximino. “Professor Doutor Geraldino da Silva Baltazar Brites. In memoriam”. Folia Anatomica Vniversitatis Conimbrigensis, vol. XVI, n.º 16 (1941).

Cunha, Fanny Andrée Font Xavier da. “Geraldino Brites (1882-1941), Biobibliografia”. Separata das Publicações do Museu Nacional da Ciência e da Técnica, n.º 7 (1979).

Fonseca, F. B. da. “Recordando Geraldino Brites (1882-1941)”.  Momento Médico, vol. 22, n.º 338, 1982. 

Pereira, Carolina Henriques. “Geraldino Brites e as questões de ensino (1926-1934)”. Revista Portuguesa de História vol.50, 2019.

Pereira, Carolina Henriques. “Retrato de São Pedro de Moel e do Pinhal de Leiria (1929)”. Anais Leirienses – estudos e documentos, n.º 2, 2019.

Ribeiro, Fernando de A. “Geraldino Brites”. Separata da Coimbra Médica, vol. VIII, n.º 9, 1941. 

Roldão, Gabriel. “BRITES, Professor Doutor Geraldino [0200]”. Elucidário do Pinhal do Rei, Marinha Grande: Textiverso, 2017.

Salgueiro, Ângela S. G. Ciência e Universidade na I República. Lisboa: Caleidoscópio, 2018.