Covilhã, 30 janeiro 1868 — Santo Tirso, 17 março 1933
Palavras-chave: Brotéria, Companhia de Jesus, física, radioatividade, telegrafia sem fios.
DOI: https://doi.org/10.58277/ICDE3331
António da Costa e Oliveira Pinto tinha catorze anos quando ingressou na Companhia de Jesus no Noviciado do Barro, no dia 12 de agosto de 1882. Estudou Filosofia e Ciências Naturais no Colégio de São Francisco (1891–1893) em Setúbal e no Colégio de São Fiel (1893–1895) em Louriçal do Campo. Enquanto estudante de Filosofia, ensinou matemática em São Francisco (1892–1893) e física, química e história. Natural em São Francisco (1891–1892) e em São Fiel (1893–1895). Estudou Teologia em Oña (1895–1897) e em Vals-près-Le-Puy (1897–1899), na região de Haute-Loire, em França. Foi ordenado presbítero em 1898 em Vals-près-Le-Puy e professou os últimos votos na Companhia de Jesus a 2 de fevereiro de 1901 em Lisboa. Entre 1901 e 1910, ensinou Matemática, Física, Química e História Natural no Colégio de Campolide, em Lisboa, onde desenvolveu grande parte da sua carreira científica.
Em Campolide, Oliveira Pinto procurou promover o ensino experimental das ciências naturais, sobretudo através da Academia Científica e Literária de Maria Santíssima Imaculada e do Instituto de Ciências Naturais. Como nos séculos anteriores, os jesuítas portugueses fomentaram a criação de academias científicas nos seus colégios. Constituídas pelos melhores alunos dos diversos anos, as academias promoviam a discussão de matérias científicas coevas nas suas sessões ordinárias. Uma ou duas vezes por ano, organizavam sessões solenes, onde os alunos explicavam os fundamentos teóricos de uma determinada tese, realizando, de seguida, experiências que a comprovassem. As sessões solenes chegaram a ser presididas pelo príncipe D. Luís Filipe e pelo infante D. Manuel de Bragança, em 1905, e pelo Diretor Geral da Instrução Pública, em 1906, e representaram um espaço da maior importância para a popularização científica dos jesuítas e para a sua credibilização enquanto cientistas e educadores modernos. Entre 1873 e 1910, as experiências realizadas em Campolide envolveram, por exemplo, descargas elétricas de alta frequência, magnetismo, raios catódicos, raios X, telegrafia sem fios, cristais sólidos e cristais líquidos. Enquanto diretor da secção de ciências da academia (1904–1910), Oliveira Pinto desempenhou um papel fundamental não só nas sessões ordinárias, mas também na escolha das teses apresentadas nas sessões solenes, como se verificou, por exemplo, no caso da telegrafia sem fios. Oliveira Pinto tinha realizado experiências com telegrafia sem fios em Campolide em 1902, isto é, apenas um ano após as primeiras experiências realizadas em Portugal. Três anos depois, na sessão solene realizada no dia 16 de março de 1905, Raúl Dias Sarreira (1889–1968), académico da classe de ciências e futuro missionário jesuíta em Moçambique (1943–1968), demonstrou publicamente como se poderiam realizar comunicações através da telegrafia sem fios.
Entre 1908 e 1910, Oliveira Pinto fundou e dirigiu em Campolide o Instituto de Ciências Naturais. Este instituto agregava num só organismo o Museu de História Natural, a biblioteca científica, o Gabinete de Física e os Laboratórios de Química, Zoologia, Botânica, Mineralogia e Ciências Naturais. Um dos principais objetivos do instituto era contribuir para a formação científica dos alunos do colégio que, por essa razão, eram convidados a participar ativamente na manutenção das coleções e nos trabalhos de classificação taxonómica. No ano da fundação do instituto, Oliveira Pinto estendeu ainda a participação aos antigos alunos, que convidava a contribuírem para as coleções do museu com animais, plantas e minerais provenientes das colónias. Em 1908, o acervo do museu era constituído por colecções etnológicas, onde se encontrava, por exemplo, a múmia que pertencera à colecção do marquês de Angeja, e que era a única existente em Portugal, colecções de numinástica e heráldica e ainda colecções mineralógicas, geológicas, zoológicas e botânicas, sendo que as colecções de musgos, fungos e de mixomicetes eram consideradas de grande qualidade pelos seus pares. Em 1909, o acervo do museu aumentou significativamente, destacando-se a entrada de mais de 1 500 novas espécies de fungos e um leão, com mais de 2 m de comprimento, trazido da Zambézia por um missionário jesuíta e preparado por António Mendes, taxidermista do museu Bocage. Das atividades pedagógicas e científicas e dos princípios que regeram o seu funcionamento compreende-se que o seu objetivo não era divulgar apenas uma versão simplificada da ciência, mas sim reproduzir, tanto quanto possível, a atividade científica em áreas como a Botânica, a Zoologia, a Física, a Química e a Mineralogia. Concebido como uma instituição de fronteira entre o ensino e a prática das ciências, o Instituto de Ciências Naturais de Campolide refletia a preocupação do seu diretor em preparar cientificamente uma nova geração e em divulgar e promover a investigação em ciências naturais no nosso país.
Um facto de especial importância na vida científica de António Oliveira Pinto foi a sua participação no I Congresso Internacional de Radiologia e Ionização, em Liège, no ano de 1905. Entre os trezentos participantes deste congresso encontravam-se, por exemplo, Arrhenius, Becquerel, Pierre Curie, Lord Kelvin, Lord Rayleigh, Rutherford e J. J. Thomson. Ao contrário de outros governos europeus, o governo português não enviou nenhuma delegação oficial a este congresso, pelo que a participação portuguesa se ficou a dever, exclusivamente, à presença de Oliveira Pinto e de outro jesuíta. Em 1910, o jesuíta português participou também no II Congresso Internacional de Radiologia, em Bruxelas. Tal como acontecera na reunião anterior, a comissão de honra deste congresso contava com a participação de físicos de renome internacional como Marie Curie, Lord Rayleigh, Ramsay, Thomson, Lorentz, Arrhenius, Poincaré e Planck. Enquanto no congresso de 1905, Oliveira Pinto não apresentou nenhuma comunicação, em 1910, apresentou os resultados das suas experiências sobre a radioatividade das águas minerais portuguesas, as primeiras experiências com radioatividade realizadas em Portugal. A realização deste estudo só fora possível porque o jesuíta tinha trabalhado nesse mesmo ano no laboratório de Pierre e Marie Curie, onde se tinha familiarizado com as técnicas radiológicas mais recentes. Para realizar os seus estudos sobre a radioatividade das águas minerais, Oliveira Pinto utilizou uma solução de brometo de rádio, obtida no laboratório dos Curie, indispensável à calibração dos eletroscópios de que se serviu. Na comunicação que apresentou em Bruxelas, o jesuíta começou por salientar a importância terapêutica da radioatividade, advertindo, no entanto, que o estudo metódico da radioatividade se encontrava ainda numa fase inicial. Depois de descrever detalhadamente a técnica utilizada, apresentou os resultados das suas experiências, concluindo que—apesar da radioatividade das águas analisadas não ser acentuada—se podiam classificar as fontes como radioativas.
Sócio da Societé Astronomique de France e da Real Sociedad Española de Física y Química, Oliveira Pinto foi ainda fundador e primeiro vice-secretário da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais. Em outubro de 1910, viu os seus instrumentos e manuscritos científicos confiscados pelo Governo Provisório da República Portuguesa. Mais tarde, conseguiu recuperar parte dos seus manuscritos, graças à intervenção de republicanos influentes. No exílio, destacou-se, sobretudo, pelos cargos governativos que desempenhou. Enquanto Provincial da Companhia de Jesus (1912-1918), estabeleceu uma casa de escritores em Alsemberg (Bélgica) em 1912. Nomeado superior da missão portuguesa do Brasil Setentrional em 1919, fundou o Colégio Manuel da Nóbrega, no Recife, e a Escola Apostólica de Baturité. Foi ainda reitor do Colégio António Vieira, na Baía, entre 1925 e 1930. Regressou a Portugal em 1932, e faleceu no dia 17 de março de 1933 nas Caldas da Saúde, em Santo Tirso.
Obras
Pinto, António de Oliveira. “Primeiro congresso internacional de radiologia e ionização.” Brotéria 5 (1906): 129–134.
Pinto, António de Oliveira. “Crystaes líquidos.” Brotéria 5 (1906): 258–267.
Pinto, António de Oliveira. “Lampadas electricas.” Brotéria: Vulgarização Científica 7 (1908): 107–126.
Pinto, António de Oliveira. “O Instituto de Sciencias Naturaes do Collegio de Campolide.” O Nosso Collegio 5 e 6 (1908-1910): 99–113 e 143–149.
Pinto, António de Oliveira. Primeira contribuição para o estudo da radioactividade das aguas mineraes de Portugal. Porto: Typographia Occidental, 1910.
Pinto, António de Oliveira. “Première Contribution a l’Étude de la Radioactivité des Eaux Minérales du Portugal.” II Congrès International de Radiologie et d’Electricité, 3-8. Bruxelas: Imprimerie Médicale et Scientifique L. Severeyns, 1911.
Pinto, António de Oliveira. “Telegraphia sem fio.” Brotéria: Vulgarização Científica 9 e 10 (1910-1912): 181–203, 14–33 e 200–245.
Pinto, António de Oliveira. “Eclipse do sol de 17 de Abril de 1912.” Brotéria: Vulgarização Científica, 10 (1912): 194–306.
Pinto, António de Oliveira. “Liquefacção e solifidicação do Hydrogenio.” Brotéria: Vulgarização Científica 10 (1912): 287–293.
Pinto, António de Oliveira. “O estudo da radioactividade da materia. Laboratorio de Giff.” Brotéria: Vulgarização Científica 11 (1913): 51–68.
Pinto, António de Oliveira. “A radioactividade das aguas medicinaes de fraca mineralização.” Brotéria: Vulgarização Científica 13 (1915): 244–245.
Bibliografia sobre o biografado
Carvalho, José Vaz de. “António da Costa e Oliveira Pinto.” In Diccionario Histórico de la Compañía de Jesús, vol. 4: 3141. Madrid e Roma: Universidade Pontificia Comillas e Institutum Historicum Societatis Iesu, 2001.Romeiras, Francisco Malta e Henrique Leitão. “Jesuítas e ciência em Portugal. I: António Oliveira Pinto S. J. e as primeiras experiências com radioactividade em Portugal.” Brotéria 174 (2012): 9–20.