Póvoa de Varzim, 18 maio 1866 — Matosinhos, 2 maio 1909
Palavras-chave: etnologia, arqueologia, naturalismo, Revista de Ciências Naturais e Sociais, Revista Portugália.
DOI: https://doi.org/10.58277/PTPB2140
Rocha Peixoto foi um etnógrafo, arqueólogo, naturalista e museólogo e uma das figuras de maior relevo na vida cultural e científica portuense na transição do século XIX para o século XX.
Rocha Peixoto foi o décimo-primeiro dos doze filhos de António Luís da Rocha Peixoto, médico, cirurgião e militante miguelista, e de Constança Amélia Pereira da Costa Flores, natural de Vila do Conde.
Ainda jovem, e com o percurso académico incompleto, Rocha Peixoto começou a trabalhar, escrevendo para os jornais, pois tinha a seu cargo o sustento da sua família, mãe e irmãs, devido ao falecimento do seu pai.
Frequentou, no Porto, o Colégio de Nossa Senhora do Rosário e, aos quinze anos, pertenceu ao corpo fundador da revista estudantil Boletim Litterario. Revista Académica Mensal, que editou três números.
Aos dezasseis anos, publicou, sob o nome de Augusto César, vários artigos críticos sobre os Jesuítas no jornal da Póvoa de Varzim, A Independência, em resposta a Afonso dos Santos Soares, defensor da Companhia de Jesus.
Em 1884, frequentou o Instituto Escolar de S. Domingos (convertido mais tarde em Escola Académica), tendo por condiscípulos António Nobre e Alexandre Braga. Conviveu com Hamilton de Araújo, Fonseca Cardoso e Ricardo Severo, organizadores do Grémio Oliveira Martins.
Em 1888, fundou no Porto, com Fonseca Cardoso, João Barreira, Ricardo Severo e Alfredo Xavier Pinheiro, a Sociedade Carlos Ribeiro, tendo por objectivo a difusão das Ciências Naturais e Sociais em Portugal. A designação da sociedade era uma homenagem ao célebre geólogo e arqueólogo, responsável pela realização, em setembro de 1880, da célebre IX Sessão do Congresso Internacional de Antropologia e de Arqueologia Pré-Históricas. A esta instituição científica se associaram importantes vultos da ciência da época, como Basílio Teles, António Arroio, António Nobre e Augusto Nobre, entre outros. Esta sociedade publicou entre 1890 e 1898, cinco volumes do seu órgão científico, a Revista de Sciencias Naturaes e Sociaes, dirigida por Rocha Peixoto e Ricardo Severo, a quem se associoumais tarde, Wenceslau de Lima. Esta publicação foi um importante repositório nos domínios das Ciências Naturais, Ciências Sociais, Arqueologia, Etnografia e História, que, pela qualidade demonstrada, mobilizou uma plêiade importante de colaboradores, cumprindo, na prática, o objectivo principal da Sociedade. Em 1898, esta agremiação decidiu extinguir-se, publicando no seu derradeiro número um artigo justificativo .
Rocha Peixoto publicou em opúsculos e em jornais, dos quais se destacam, no Porto, O Primeiro de Janeiro, e em Lisboa, O Século. Denunciou, através de artigos, a degradação do Museu Municipal do Porto, revelando a inércia do seu tempo, reconhecendo a inadiável necessidade de incutir um novo impulso à atividade científica, realidade aliás já claramente exposta na primeira monografia editada pela Sociedade Carlos Ribeiro, em 1888.
Defendeu ideias republicanas, alinhando desde a juventude no forte movimento nacionalista de feição crítica, progressista e dinâmica, que os meios intelectuais do Porto preconizavam então, e que visava o esclarecimento mental do país e o seu desenvolvimento económico. Participou na revolta de 31 de janeiro de 1891 no Porto, do qual resultou um levantamento militar contra as cedências do Governo, e da Coroa, ao Ultimato Britânico.
Colaborou na Revista de Portugal a convite de Eça de Queirós, a partir de 1891.
Na Academia Politécnica do Porto, organizou, como naturalista, o Gabinete de Mineralogia, Geologia e Paleontologia, publicando os catálogos das respectivas colecções desta instituição (1890–1891).
O reconhecimento da sua erudição, através da publicação da obra etnográfica: Notas sobre a Malacologia popular, e de outra de cariz antropológico/etnográfico: A Tatuagem em Portugal, contribuíram para que, em 1893, fosse nomeado sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa.
Desempenhou o cargo de bibliotecário do Ateneu Comercial do Porto e leccionou Geografia e Ciências Físico-Naturais na Escola Industrial Infante D. Henrique, no Porto. Em 1895, iniciou a colaboração com a Revista d’Hoje.
Depois da extinção da Sociedade Carlos Ribeiro e da Revista de Sciencias Naturaes e Sociaes em 1898, Rocha Peixoto fundou, em 1899, com Ricardo Severo e Fonseca Cardoso, a revista Portugalia (1899 a 1908), de carácter semelhante ao da anterior, mantendo a maioria dos colaboradores, embora o aparato gráfico fosse muito diferente, primando pela elevada qualidade, sem paralelo nas escassas revistas científicas portuguesas de então.
A evidente visibilidade e prestígio rapidamente obtidos pela novel publicação, onde assumiu as funções de “Redactor-em-Chefe”, guindou-o à posição de conservador do Museu Municipal do Porto, acumulando com o cargo de diretor da Biblioteca Municipal do Porto, interinamente entre 1900 a 1904 e de nomeação definitiva entre 1904 e 1909.
Foi responsável pela transferência do Museu para as novas instalações e pela reorganização das diversas secções do acervo, a saber, de Mineralogia, de Paleontologia, de Etnografia, de Arqueologia, de Artes Decorativas e de Numismática. Em 1902, com Joaquim de Vasconcelos, criou o Guia do Museu Municipal do Porto. Nesta instituição. Ampliou e reformou instalações, aumentou secções e enriqueceu colecções com a aquisição de valiosos espécimes arqueológicos e etnográficos. Na Biblioteca, fomentou profundas obras de restauro do edifício, a reorganização dos seus serviços e a modernização da classificação e catalogação dos livros. Impulsionou a criação de mais três novas bibliotecas (no Bonfim, em Cedofeita e na Foz) e promoveu doações às bibliotecas da Póvoa de Varzim e de Ponte de Lima.
Em 1901, foi nomeado naturalista-adjunto da secção de Mineralogia da Academia Politécnica do Porto e, dois anos mais tarde, foi distinguido pelo ministro da Guerra Luís Augusto Pimentel Pinto, juntamente com os outros responsáveis da revista Portugália.
Promoveu vários estudos sobre o património arqueológico, histórico e etnológico da Póvoa de Varzim, sua terra natal, destacando-se os trabalhos de campo na Cividade de Terroso e do Castro de Laúndos, e envolveu-se na defesa da comunidade piscatória poveira.
Rocha Peixoto morreu em 1909, vítima de tuberculose aguda, sendo sepultado no Cemitério de Agramonte, no Porto. No mesmo ano, o seu corpo foi trasladado para o Cemitério da Póvoa de Varzim, a pedido da respetiva Câmara Municipal.
José Luís Cardoso
Instituto de Ciências Sociais
Arquivos
Biblioteca Digital Rocha Peixoto
Póvoa de Varzim, Biblioteca Municipal Rocha Peixoto
Obras
Peixoto, A. A. da Rocha. Museu Municipal do Porto (História Natural). Porto: s. n., 1888.
Peixoto, António Augusto da Rocha. “As Olarias do Prado.” Portugalia 1 (1900).
Peixoto, Rocha. Notas sobre a Malacologia Popular. Porto: Typ. Occidental, 1889.
Peixoto, Rocha. A Tatuagem em Portugal. Porto: Typ. Occidental, 1892.
Peixoto, Rocha. “Os palheiros do Littoral.” Portugalia 1 (1899).
Peixoto, Rocha. “Uma Iconografia Popular em Azulejos.” Portugalia 1 (1901).
Peixoto, Rocha. “A Pedra dos Namorados.” Portugalia 1 (1903).
Peixoto, Rocha. “Formas da Vida Communalista em Portugal. Summario de uma monographia imedita.” In Exposição Nacional do Rio de Janeiro em 1908. Secção Portuguesa. Notas sobre Portugal, vol. 1, 73-83. Lisboa: Imprensa Nacional, 1908.
Peixoto, Rocha. As Filigranas. Porto: Imprensa Portugueza, 1908.
Peixoto, Rocha. Noticias acerca das explorações archeologicas da Cividade de Terroso e do Castro de Laundos no concelho da Povoa de Varzim (1906-1907). Porto: Imprensa Portugueza, 1908.
Bibliografia sobre o biografado
Brandão, D. de Pinho. “Rocha Peixoto e a arqueologia.” Póvoa de Varzim: Boletim Cultural 5 (2) (1966): 149–164.
Cardozo, Mário. “Martins Sarmento e os Homens da «Portugália». À memória de Rocha Peixoto.” Póvoa de Varzim: Boletim Cultural 5 (2) (1966): 72–88.
Gonçalves, Flávio. Rocha Peixoto (depoimentos e manuscritos). Matosinhos: Câmara Municipal de Matosinhos,1966.
Lima, Maria Clementina Ferreira Pires de. “Ainda o Colóquio Internacional de estudos etnográficos Rocha Peixoto, realizado na Póvoa de Varzim.” Revista de Etnografia 17 (1966).
Lima, Maria Clementina Ferreira Pires de. “Colóquio Internacional de estudos etnográficos Rocha Peixoto.” Revista de Etnografia 14 (1966).
Santos Júnior, Joaquim Rodrigues dos. “Rocha Peixoto como cientista no âmbito da etnografia e da antropologia.” Póvoa de Varzim 5 (2) (1966): 215–267.