Mouta, Fernando de Oliveira Velez

Lisboa, 2 setembro 1900 – ?,  26 julho 1963

Palavras-chave: Angola, Cartografia Geológica, Geologia Colonial.

DOI: https://doi.org/10.58277/ZSJC8471

Fernando de Oliveira Velez Mouta foi um engenheiro de minas português. A sua ação contribuiu para a ocupação científica das colónias e participação de Portugal nos compromissos geológicos internacionais.

Fernando Mouta nasceu em Lisboa, onde se licenciou em Engenharia de Minas pelo Instituto Superior Técnico (IST). Em 1922, com 22 anos iniciou a carreira profissional na recém-criada ‘Missão Geológica de Angola’ que tinha como objetivo a cartografia geológica da então colónia portuguesa.

Após a sua nomeação para o quadro comum do Império como engenheiro de minas dos serviços de indústria, geologia e minas de Angola, apresentou a primeira carta geológica da colónia de Angola ao Congresso Internacional de Geologia, realizado em Washington, em 1933.

Foi presidente da Câmara Municipal de Luanda entre 1935 e 1939 e foi condecorado com o grau de Comendador da Ordem de Cristo. 

Depois de um curto período em que desenvolveu a sua atividade profissional em empresas particulares, foi contratado como chefe de brigada para trabalhos de levantamento da carta geológica de Angola. Terminado esse contrato, exerceu as funções de professor catedrático além do quadro da cadeira de Geologia e Paleontologia Portuguesas do IST (1949-1951). 

Em julho de 1951 foi contratado pela Junta de Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar (JIU) como investigador de geologia. Aí desenvolveu o estudo das formações geológicas do Karroo de Angola. Ainda ao serviço da junta, reunindo os conhecimentos geológicos existentes, reformulou a carta geológica de Angola e notícia explicativa. Desempenhou o cargo de chefe dos serviços de indústria e geologia da Província de Moçambique a partir de 1955, sendo nomeado diretor no ano seguinte.

Desde 1926 e até à sua aposentação, Mouta foi um participante assíduo nos vários congressos geológicos internacionais, em representação das colónias, do Ministério do Ultramar, ou da JIU. A partir de 1950, quando foi nomeado membro suplente e mais tarde, membro efetivo do Conselho Científico Africano, participou nas reuniões deste organismo, onde eram discutidos os interesses coloniais dos vários países.

Os compromissos internacionais assumidos nestes encontros, bem como a participação como delegado nas comissões da carta geológica internacional de África e mais tarde, a carta geológica do mundo, permitiram-lhe uma visão ampla para os problemas que a investigação geológica enfrentava no Império português e em particular, em Angola. 

Defensor da geologia como uma ciência fundamental para o desenvolvimento das colónias e da sua ocupação efetiva, considerou que muitos dos problemas geológicos podiam ser resolvidos a partir de estudos que envolvessem a cartografia geológica, dando origem ao conhecimento dos recursos disponíveis, com evidentes consequências para o fomento económico, através do desenvolvimento da exploração mineira e da agricultura. Considerava que o desenvolvimento da carta geológica numa Nação era “um marco do seu grau de civilização”.

A noção do avanço da investigação realizada pelas potências europeias nas colónias africanas foi também o ponto de partida da sua agenda de modernização. Apresentando uma postura interventiva, Fernando Mouta foi crítico da pouca atenção prestada à geologia e ao desenvolvimento da investigação científica, defendendo a criação de instituições de suporte a essa atividade, como um Instituto de Investigação Científica Colonial, Museu de História Natural em Angola, bem como a reorganização dos serviços geológicos. Considerava que os trabalhos de geologia desenvolvidos eram reduzidos para as necessidades, não tendo a continuidade necessária que permitisse a formação de novos profissionais e a criação de “escola ou tradição” nessa área científica.

A formação em Engenharia de Minas não limitou o campo de investigações a que se dedicou, apresentando nos vários encontros internacionais, trabalhos que cruzam geologia, etnografia e arqueologia. A realização de campanhas de campo e o contacto com diferentes povos despertou o interesse por aspetos etnográficos, levando à edição de “Etnografia Angolana”. Por outro lado, o debate sobre as origens do homem levou-o a encontros internacionais e à divulgação de investigações detalhadas, no cruzamento da paleontologia e da antropologia. Os seus trabalhos foram desenvolvidos em colaboração com numerosos cientistas portugueses e estrangeiros.

A sua atividade profissional terminou em 1958 ao serviço da Província de Moçambique, após desenvolver um trabalho de investigação científica e de cooperação internacional relevante para o conhecimento do continente africano, durante mais de 30 anos.

Miguel Teixeira
Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

Arquivos

Lisboa, Arquivo Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, I.P., Fundo Engenheiro Fernando Mouta.

Lisboa, Arquivo Nacional Torre do Tombo, Fundo Direção-Geral da Administração Pública, Departamento de Integração Administrativa, Série Processos de Funcionários do Ultramar, Fernando de Oliveira Mouta.

Lisboa, Arquivo Histórico do Instituto de Investigação Científica Tropical, Universidade de Lisboa, Processo individual de Fernando Mouta.

Obras

Mouta, Fernando. Bibliografia geológica de Angola. Lisboa: Agência Geral das Colónias, 1934.

Mouta, Fernando. Etnografia Angolana: Subsídios. Porto: Litografia Nacional, 1934.

Mouta, Fernando. Subsídio para a organização de um Instituto de Investigação Científica Colonial. Separata Revista da Associação dos Engenheiros Civis Portugueses nº 707. Lisboa: Associação dos Engenheiros Civis Portugueses, 1934.

Mouta, Fernando. Criação em Angola de um Museu de História Natural: Utensilhagem Colonial: 5ª Comissão. Primeira Conferência Económica do Império Colonial Português. Lisboa: Tipografia da Empresa do Anuário Comercial, 1936.

Mouta, Fernando. Possibilidade de existência de pré-hominídeos no Sul de Angola (Leba Humpata). Separata Anais do Instituto de Medicina Tropical. Porto: Imp. Portuguesa, 1953.

Mouta, Fernando. Notícia Explicativa do Esboço Geológico de Angola. Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1954.

Mouta, Fernando. Esboço tectónico de Angola: Notícia Explicativa. Anais da Junta de Investigações do Ultramar, Vol. X, Tomo V. Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1956.

Bibliografia sobre o biografado

“Mouta (Fernando de Oliveira Velez)” In Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol. 18, 35-36. Lisboa – Rio de Janeiro: Editorial Enciclopédia Lda., s.d.

Teixeira, Carlos

Aboim, Fafe, 23 outubro 1910 — Lisboa, 7 junho 1982

Palavras-chave: Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, escola de investigação, cartografia geológica.

DOI: https://doi.org/10.58277/LKGQ1507

Carlos Teixeira era filho de Joaquina Teixeira de Magalhães, solteira, e de pai desconhecido. Crê-se, no entanto, que o pai terá sido um padre amigo do seu tio José Teixeira, também ele padre, e que, durante algum tempo, se hospedou em casa da família. Carlos Teixeira cresceu numa família de lavradores com poucas posses, tendo os seus dois tios maternos, José e Manuel Teixeira, sido fundamentais na sua educação, tanto do ponto de vista material como espiritual.

Os primeiros anos da vida de Carlos Teixeira foram passados no campo, em São Pedro, freguesia de Rossas, concelho de Vieira do Minho, circunstância que terá sido responsável pelo seu apego à terra e amor à Natureza. Chegado à idade escolar, foi levado pelo seu tio padre para Casas Novas, Redondelo, no concelho de Chaves, onde complementou a frequência da escola primária com o ensino ministrado, em casa, pelo tio. Entre 1922 e 1929, frequentou o liceu, primeiro em Chaves e, depois, em Braga.

Carlos Teixeira tinha a intenção de cursar Medicina na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) mas acabou por optar pela licenciatura em Ciências Histórico-Naturais, decisão ditada pela falta de dinheiro: uma licenciatura mais breve era menos dispendiosa. A difícil situação financeira de Carlos Teixeira enquanto estudante, levou-o a trabalhar como perfeito em dois colégios do Porto a fim de suportar os custos do ensino universitário. Carlos Teixeira ingressou na FCUP no ano lectivo de 1929/1930 e terminou a licenciatura em 1933, com quinze (15) valores. No mesmo ano, foi convidado por Gonçalo António da Silva Ferreira Sampaio (1865–1937)—que tinha sido seu professor e com quem obteve uma boa classificação—para assistente extraordinário de Botânica na mesma Faculdade. Simultaneamente, cursou Ciências Pedagógicas na Universidade de Coimbra e deu aulas no Liceu de Braga.

O final da licenciatura coincidiu com a provável integração de Carlos Teixeira na escola de investigação liderada por António Augusto Esteves Mendes Correia (1888–1960) no Instituto de Antropologia da FCUP, por ele fundado e dirigido. Mendes Correia era então professor catedrático do 1º grupo, Mineralogia e Geologia, da 3ª secção, Ciências Histórico-Naturais, da FCUP e, até 1936, dirigiu, igualmente, o Museu e Laboratório Mineralógico e Geológico (MLMG). Mendes Correia foi professor de Carlos Teixeira nas cadeiras de Geologia, Geografia Física, Paleontologia e Antropologia. A influência de Mendes Correia revelou-se decisiva no modo como Teixeira encarava o conhecimento e a prática científica e é provável que lhe tenha servido de modelo quando criou a sua própria escola de investigação em geologia na década de 1950.

Em 1937, Carlos Teixeira foi contratado como naturalista do MLMG, circunstância que determinou que a sua vida científica e profissional acabasse por ser dedicada à geologia. O próprio, aliás, sempre atribuiu esta circunstância à influência de João Carrington Simões da Costa (1891–1982) e Domingos José Rosas da Silva (1896–1967), ambos professores de geologia na FCUP, tendo o primeiro precedido Teixeira no cargo de naturalista no MLMG. Entretanto, Carlos Teixeira iniciou a preparação de uma tese de doutoramento dedicada ao Carbónico de Portugal, tendo estagiado no Instituto Geológico da Universidade de Lille, França, em 1938, na qualidade de bolseiro do Instituto para a Alta Cultura (IAC).

Em Lille, Teixeira trabalhou com os especialistas do Paleozóico superior Paul Bertrand (1879–1944), Pierre Pruvost (1890–1967) e Paul Corsin (1904–1983). A sua situação de bolseiro deu-lhe a oportunidade de, por um lado, contactar de modo continuado, pela primeira vez, com a prática científica em vários países estrangeiro — França mas também Bélgica e Suíça — e, por outro, de travar conhecimento com algumas figuras ligadas ao meio científico português e que, tal como ele, eram bolseiros do IAC. Em Paris, conheceu os geógrafos António de Medeiros Gouveia (1900–1972) e Orlando Ribeiro (1911–1997), com quem acabaria por desenvolver, de regresso a Portugal, relações de trabalho e amizade. Foi igualmente em Paris que conheceu o geólogo francês Georges Zbyszewski (1909–1999), que, em 1940, se estabeleceu em Portugal como geólogo dos Serviços Geológicos (SG), de quem se tornou igualmente amigo e com quem manteve uma significativa colaboração científica.

De regresso a Portugal, Carlos Teixeira integrou o grupo de geólogos que, a partir da segunda metade da década de 1930, foi responsável por um período de intensa actividade científica na FCUP. Foi neste contexto que, em 1940, Carrington da Costa, Carlos Teixeira e João Manuel Cotelo Neiva (1917–20) criaram a Sociedade Geológica de Portugal.

Carlos Teixeira obteve o doutoramento pela FCUP em 1944, o mesmo ano em que se tornou colaborador oficial dos SG. Carlos Teixeira continuou a ocupar o lugar de naturalista do MLGM até 1946, mas, neste ano, deixou a FCUP, ingressando como 1º assistente de geologia na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). Em 1948, realizou as provas de agregação e, em 1950, ascendeu a professor catedrático. 

Geólogo de campo por excelência, Carlos Teixeira foi o principal responsável pela introdução da prática de campo sistemática na licenciatura em Ciências Geológicas—a partir de 1964, licenciatura em Geologia—da FCUL. 

Todavia, a sua iniciação na prática da Geologia em contexto académico não terá sido diferente da que era habitual, na época, em Portugal: o trabalho de gabinete, concretamente, no caso de Teixeira, o trabalho de gabinete enquanto naturalista de MLMG. É preciso recuar aos anos da licenciatura em Ciências Histórico-Naturais para detectar o rasto das primeiras saídas de campo de Teixeira, realizadas sob orientação de Rui de Serpa Pinto (1907–1933), licenciado em Matemática e Engenharia Civil que acabou por se dedicar à investigação em Antropologia, Arqueologia e Geologia e que, em 1930, se tornou assistente do grupo de Mineralogia e Geologia da FCUP. Mais tarde, durante a preparação do doutoramento, a estadia de Teixeira no Instituto Geológico de Lille ter-se-á revelado fundamental, uma vez que a instituição era reconhecida enquanto escola de formação em trabalho de campo. De regresso a Portugal, a colaboração científica com os SG, em particular com o geólogo Georges Zbyszewski e com os colectores da instituição, poderá ser entendida como uma derradeira etapa na formação de Carlos Teixeira enquanto geólogo de campo.

Carlos Teixeira foi o líder daquela que terá sido a primeira escola de investigação em geologia existente em Portugal, criada pelo IAC, em 1956, no Centro de Estudos de Geologia Pura e Aplicada sediado na mesma Faculdade. Foi desta escola que saíram alguns dos mais significativos geólogos portugueses da segunda metade do século XX, muitos dos quais, como os próprios reconheceram, tiveram como mestre Carlos Teixeira. Foi o caso, por exemplo, de Francisco Gonçalves (1926–1997), João José Cardoso Pais (1949–2016), António Marcos Galopim de Carvalho (1931) ou Rogério Eduardo Bordalo da Rocha (1941).

Teixeira foi um líder carismático, que exerceu uma liderança forte e efetiva, a raiar, por vezes, o autoritarismo. A par da sua indiscutível competência científica, o significativo poder institucional de Carlos Teixeira permitiu-lhe a obtenção de bolsas e a colocação de discípulos em diversas instituições ligadas à Geologia, com destaque para as universidades e os SG, onde era colaborador científico desde 1944. A liberdade de movimentos de Teixeira nesta instituição era de tal modo significativa que, durante as décadas de 1960 e 1970, os SG funcionaram como uma escola prática de geologia, extensão da escola de investigação da FCUL, que não possuía os recursos humanos e materiais adequados à prossecução de trabalho de campo. A existência desta escola prática nos SG permitiu o estreitamento e a consolidação de relações entre a instituição e a FCUL que se mantiveram durante muito tempo.

A Revolução de Abril de 1974 trouxe mudanças radicais e abruptas no quotidiano universitário. O poder significativo de que Carlos Teixeira tinha disfrutado durante o regime ditatorial conduziu a uma situação de confronto com a nova academia, levando Teixeira, que se considerava injustiçado, a afastar-se da FCUL.

Para além do desenvolvimento da sua carreira como professor na FCUL, Carlos Teixeira desempenhou um papel relevante em instituições que, de algum modo, contemplavam algum tipo de atividade geológica. Foi o caso da Junta de Investigações do Ultramar (JIU), onde foi vogal e chefiou o Laboratório de Estudos Petrológicos e Paleontológicos, e da Junta de Energia Nuclear (JEN), onde foi igualmente vogal e consultor científico, tendo acompanhado os levantamentos geológicos de áreas com mineralizações de urânio em Portugal continental. Teixeira desempenhou ainda o papel de consultor benévolo em diversas outras instituições públicas.

A detenção destes cargos e posições devem-se, em grande parte, às relações que mantinha com personalidades que detiveram alguma relevância institucional e política durante o Estado Novo, com destaque para Carrington da Costa e Mendes Correia. Deve-se, certamente, a Carrington da Costa as funções que Teixeira desempenhou na JEN e na JIU, uma vez que o primeiro desempenhou cargos executivos em ambas as instituições. Se o percurso científico e profissional destes três homens se começou a cruzar na FCUP, na década de 1930, entre eles acabaram por se estabelecer relações de grande proximidade e afinidade: começaram por ser mestre/aluno e colegas e acabaram por se tornar amigos.

Da obra científica de Carlos Teixeira constam quase quinhentos trabalhos, dedicados não apenas à geologia de Portugal continental, mas também à das antigas possessões coloniais portuguesas.

Todavia, os primeiros trabalhos científicos de Teixeira, que datam de 1934, são dedicados à arqueologia, antropologia e etnologia, encontrando-se relacionados com a sua integração na escola de investigação liderada por Mendes Correia. Até ao final da década de 1930, e ainda durante o ano de 1940, Teixeira continuou a publicar, preferencialmente, nestas áreas; de facto, o seu interesse pelas mesmas acompanhou-o ao longo da vida.

Foi apenas em 1937, quando se tornou naturalista do MLMG, que Carlos Teixeira publicou os primeiros artigos científicos no âmbito da geologia, mais especificamente, da paleobotânica. O primeiro, no Boletim do Museu e Laboratório Mineralógico e Geológico da Universidade de Lisboa, é dedicado ao estudo de musgos do Carbónico português; o segundo, sobre o Estefaniano do Norte de Portugal, surge, em francês, no Bulletin de la Société Portugaise des Sciences Naturelles. As temáticas abordadas estão directamente relacionadas com a preparação da sua tese de doutoramento com o título O Antracolítico Continental Português (Estratigrafia-Tectónica).

Apesar de, inicialmente, Teixeira se ter centrado no estudo de formações geológicas anteriores ao Mesozóico—com destaque para as pertencentes ao Carbónico continental—no decorrer da sua carreira científica e profissional acabou por dedicar-se ao estudo de formações de, praticamente, todas as idades. Por outro lado, a sua investigação passou também a abarcar diversas áreas da geologia. Muitos dos seus trabalhos possuem um carácter global e abrangente, constituindo-se como verdadeiros estudos de geologia regional. Pode dizer-se que o trabalho de Carlos Teixeira—e de grande parte dos geólogos portugueses até ao último quartel do século XX—se caracterizou por uma visão global e generalista da geologia, eminentemente descritiva e, à primeira vista, baseada em pressupostos teóricos cuja aceitação em contexto nacional não foi, regra geral, problematizada. Esta visão encontrou a sua expressão máxima na realização da cartografia geológica e nos estudos de geologia regional a ela associados.

A colaboração de Carlos Teixeira com os SG permitiu-lhe a autoria ou co-autoria de uma parte significativa das folhas da Carta Geológica de Portugal na escala 1:50 000. Em 1972, foi o principal responsável pela 4ª edição da Carta Geológica de Portugal Continental na escala 1:500 000 e participou na construção e publicação das cartas geológicas do Noroeste e do Sudoeste peninsulares, resultantes de extenso trabalho conjunto com geólogos espanhóis. O estabelecimento e desenvolvimento de relações de trabalho com cientistas estrangeiros foram, aliás, uma das marcas da atividade científica e profissional de Carlos Teixeira.

Carlos Teixeira teve ainda uma importância fundamental na defesa e desenvolvimento da geologia em Portugal. Enquanto co-fundador da Sociedade Geológica de Portugal, que foi estabelecida com o objectivo de promover o reconhecimento científico e social da geologia e dos geólogos, Teixeira desenvolveu uma extensa atividade que encontrou expressão em diversas publicações e comunicações orais. O seu empenhamento na defesa da geologia e do papel dos geólogos na sociedade portuguesa extravasou o âmbito restrito da comunidade científica, adquirindo uma acentuada vertente pública, uma vez que o geólogo escreveu sobre este assunto em diversos periódicos.

Carlos Teixeira foi sócio da Sociedade Geológica de França desde cerca de 1940, onde chegou a desempenhar as funções de vice-presidente. Em 1952, tornou-se sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa e, em 1960, sócio efetivo, substituindo Mendes Correia na secção de Ciências Histórico-Naturais. Em 1955, foi eleito sócio correspondente da Real Academia de Ciências Exactas, Físicas e Naturais de Madrid. No início da década de 1950, foi responsável pela inscrição de Portugal na International Union of Geological Sciences (IUGS) e, a partir de então, passou a representar Portugal em diversos encontros científicos internacionais, nomeadamente nas sessões do Congresso Internacional de Geologia realizadas em Copenhaga, em 1964, e em Praga, em 1968

A imagem usufruída por Carlos Teixeira entre os geólogos portugueses, foi construída e perpetuada tanto pelos seus discípulos e amigos mais próximos, como pelos seus críticos. É uma imagem dúplice mas nem por isso contraditória e que hoje integra a ‘mitologia’ fundadora da comunidade geológica. Após a sua morte, e juntamente com os pioneiros da ‘época de ouro’ da geologia, Carlos Ribeiro (1814–1882), Nery Delgado (1835–1908) e Paul Choffat (1849–1919), Teixeira passou a ser considerado um dos ‘pais fundadores’ da geologia em Portugal.

Carlos Teixeira parece ter sido o geólogo de campo por excelência, conhecedor ímpar da geologia de todo o país, observador invulgar com uma memória visual fora do comum; os próprios cadernos de campo ser-lhe-iam praticamente dispensáveis. Durante o trabalho de campo, mostrava-se insensível às horas, ao frio e ao cansaço, ao calor e à chuva. A expressão ‘um geólogo não é solúvel’, repetida de geração em geração por geólogos seniores aos seus discípulos durante as primeiras saídas de campo, é-lhe atribuída.

Solteiro, praticamente sem família, Teixeira representa o estereótipo do ‘cientista sacerdote’ que renunciou aos aspetos mais mundanos da vida para se dedicar totalmente à ciência, sacrificando-se tanto do ponto de vista pessoal como material. Este último aspecto é vincado pelo testemunho da sua prodigalidade e desapego material, de que beneficiaram amigos, colegas e alunos. Personalidade forte, de carácter vincado, somam-se as qualidades de carácter: lutador, abnegado, solidário, leal, amigo do seu amigo.

Mas Carlos Teixeira é igualmente retratado como um homem de natureza difícil, autoritário, dado a zangas e humores, por vezes mesmo rancoroso, e com quem se tornava difícil conviver. Usava o prestígio e a influência de que desfrutava para satisfazer os seus interesses mas mesmo os seus críticos reconhecem que esses interesses diziam mais respeito à comunidade geológica portuguesa do que a objectivos pessoais. Na verdade, durante toda a vida, Teixeira lutou intensamente pela valorização da geologia e pela dignificação da profissão de geólogo na sociedade portuguesa.

Só é possível compreender a personalidade de Carlos Teixeira se contextualizarmos histórica e socialmente as suas ações, as suas opções científicas e profissionais, as suas idiossincrasias. Mas a sua imagem, construída e perpetuada ao longo dos anos pela comunidade geológica, não deve ser negligenciada; de outra forma, arriscamo-nos a obter uma imagem distorcida do homem e do cientista e a perpetuar ‘estórias’ e anedotas.

Há assim dois aspectos que se afiguram fundamentais na compreensão de Carlos Teixeira. Por um lado, a importância institucional e a notoriedade científica que adquiriu resultaram não só à sua inquestionável competência científica como das relações de proximidade que manteve com algumas personalidades ligadas ao Estado Novo, algumas delas ainda por reconhecer plenamente. Apesar de um não comprometimento político objectivo com a ditadura, Teixeira soube aproveitar o carácter nacionalista do regime para fazer valer os seus interesses e os da comunidade geológica em geral, que por vezes se confundiam.

Por outro, é significativa a importância que o cruzamento de valores católicos e republicanos desempenhou na formação do carácter de Carlos Teixeira. A infância num meio rural pobre, intrinsecamente rude e agreste, marcada pela ausência da figura paterna e em que a presença dos tios, um dos quais padre, se afigura determinante, cruza-se com a interiorização de valores republicanos durante a experiência universitária. Como mostram diversos testemunhos deixados pelo próprio Carlos Teixeira, as suas palavras ecoam as dos mestres Mendes Correia e Carrington da Costa, ambos republicanos, as quais enaltecem o professor universitário não apenas enquanto transmissor de conhecimentos mas também, e sobretudo, enquanto investigador original e cientista comprometido com questões intelectuais e sociais. O conhecimento e a prática científicos são considerados fundamentais para o desenvolvimento e o ‘progresso’ do país, sendo dado particular relevo ao papel da formação de discípulos no contexto de escolas de investigação.

Mas também os valores transmitidos pela educação católica de Carlos Teixeira acabaram por influenciar a sua prática científica. Foi ao catolicismo que o geólogo foi buscar valores como o trabalho árduo, a dedicação, o sacrifício e o desprendimento pelos bens materiais, que reforçam a construção de uma imagem que não é, de todo, invulgar na retórica e iconografia científicas: a do cientista cujas excepcionais e invulgares características e capacidades lhe permitem uma devoção completa à ciência. No caso de Teixeira, essa dedicação acabou por adquirir os contornos de um verdadeiro sacerdócio, reforçada pelo facto do geólogo ter permanecido solteiro, e encontrando uma espécie de culminar no final da sua vida, quando, cego devido à diabetes, continuou a trabalhar, ditando os seus trabalhos a colaboradores e amigos.

Teresa Salomé Mota
Gestão e conversação do património geológico

Arquivos

Arquivo Histórico do Laboratório Nacional de Energia e Geologia

Arquivo Histórico do Instituto de Investigação Científica e Tropical

Arquivo Histórico da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

Arquivo Histórico da Academia de Ciências de Lisboa

Arquivo Histórico Camões

Obras

Teixeira, Carlos. “Introdução.” Boletim da Sociedade Geológica de Portugal 1 (1941): 3–4.

Teixeira, Carlos. “O Antracolítico continental português (Estratigrafia-Tectónica).” Boletim da Sociedade Geológica de Portugal 5 (1945): 1–139.

Teixeira, Carlos. “Flora mesozóica portuguesa.” Memórias dos Serviços Geológicos de Portugal (1948): pp.

Teixeira, Carlos. O que Vale a Geologia. Missão do Geólogo. Lisboa: Edição de autor, 1950.

Teixeira, Carlos. “Cartografia geológica de Goa”. In A Geologia de Goa. Considerações e Controvérsias, 139–160. Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar, 1960.

Teixeira, Carlos. Carta Geológica de Portugal na escala 1/500 000. Lisboa: Serviços Geológicos de Portugal, 1972.

Teixeira, Carlos e Luís Carlos Garcia de Figuerola, Luis Carlos, dir.; Francisco Gonçalves, Francisco e J. L. Hernandez Enrile, coord. Mapa Geológico do Maciço Hespérico do Sudoeste da Península Ibérica na Escala 1/500 000. Madrid: Departamento de Petrologia e Geoquimica de la Universidade de Salamanca/Instituto Geografico y Cadastral, 1975.

Teixeira, Carlos, Rogério Rocha, Rogério e João Pais. Quadros de Unidades Estratigráficas e da Estratigrafia Portuguesa. Lisboa: Instituto Nacional de Investigação Científica, 1979.

Teixeira, Carlos e Francisco Gonçalves. Introdução à Geologia de Portugal. Lisboa: Instituto Nacional de Investigação Científica, 1980.

Teixeira, Carlos Geologia de Portugal, Volume 1—Precâmbrico Paleozóico. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1981.

Bibliografia sobre o biografado

Gonçalves, Francisco. Carlos Teixeira, Notícia Bio-bibliográfica, o Pedagogo, o Cientista. Lisboa: Edição de autor, 1976.

Ribeiro, Orlando. “A personalidade de Carlos Teixeira.” In Opúsculos Geográficos, Volume I: Orlando Ribeiro, 307–313. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.

Ribeiro, António. “Carlos Teixeira (1910–1982). O renascimento da geologia de campo no século XX.” In Memórias de Professores Cientistas, ed. Ana Simões, 90–95. Lisboa: Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, 2001.

Rocha, Rogério. “Carlos Teixeira (1910–1982)—Uma vida devotada ao serviço da Ciência.” Boletim da Sociedade Geológica de Portugal 25 (2009): 19–24.

Carneiro, Ana, Ana Simões, Maria Paula Diogo, e Teresa Salomé Mota. “Geology and religion in Portugal.” Notes and Records of the Royal Society 67 (2013): 331–354.

Delgado, Joaquim Nery

Elvas, 26 maio 1835 — Buçaco, 3 agosto 1908

Palavras-chave: Paleozoico, cartografia geológica, geologia aplicada, paleoantropologia, arqueologia, Comissão Geológica do Reino.

DOI: https://doi.org/10.58277/PZEF5182

Joaquim Filipe Nery da Encarnação Delgado, batizado a 23 de junho de 1835, na Sé de Elvas, foi filho de Francisca Rosa Delgado e do tenente-coronel José Miguel Delgado, mais tarde governador do forte da Graça, em Elvas. Foi neto de José da Encarnação Delgado, major de Artilharia, que fora governador da mesma fortificação. Aos sete anos, Nery Delgado ficou órfão de pai e foi viver com uma irmã, casada com o engenheiro militar Gilberto António Rola Júnior. Uma vez que este se opôs ao golpe militar chefiado por Costa Cabral e pelo duque da Terceira, e se recusou a declarar, por escrito, o sentido do seu voto nas eleições de 1842, foi deportado para a ilha de São Miguel, acompanhado da mulher e do pequeno Nery Delgado. Permaneceram nos Açores até 1844, ano em que regressaram a Lisboa.

Gilberto Rola inscreveu o jovem cunhado no Real Colégio Militar, em Rilhafoles, nesse mesmo ano. Concluiu o curso em 1850, com aprovação plena no exame de preparatórios e distinções nas disciplinas dos dois últimos anos. Seguidamente, Nery Delgado frequentou a Escola Politécnica, terminando o curso geral em 1853, com dois primeiros prémios, na quarta e na sétima cadeiras (respetivamente, Astronomia e Mineralogia, Geologia e Princípios de Metalurgia). Dois anos volvidos, formou-se em Engenharia na Escola do Exército, com distinção na sexta cadeira (Topografia) e na segunda parte da quarta cadeira (Hidráulica). Regressou em seguida à Escola Politécnica para frequentar, durante um ano, o curso de Minas e Docimasia que concluiu com distinção. Em 22 de outubro de 1855, foi despachado alferes efetivo.

Entretanto, com o advento da Regeneração, foi criado, em 1852, o Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria (MOPCI). Em 1856, já no posto de subtenente de Engenharia, Nery Delgado integrou uma comissão, criada no âmbito do MOPCI, encarregada de estudar a regularização das cheias do Mondego, obra que dirigiu, bem como a da barra da Figueira da Foz. O ano seguinte marcou a criação, no quadro do MOPCI, da Comissão Geológica, uma secção da Direção Geral dos Trabalhos Geodésicos, Corográficos, Hidrográficos e Geológicos do Reino, presidida pelo general Filipe Folque e dirigida pelo capitão de Artilharia Carlos Ribeiro e por Francisco António Pereira da Costa, lente de mineralogia e geologia na Escola Politécnica. A Comissão Geológica tinha por principal missão efetuar o reconhecimento e elaborar a cartografia geológica do território nacional. Nery Delgado foi nela admitido no lugar de adjunto.

Em 1860, casou com Maria Ricardina Augusta da Fonseca, que conhecera na Figueira da Foz, de quem teve três filhas – Ricardina Adelaide, Virgínia Palmira e Amélia Beatriz.

Ao cabo de onze anos de trabalho na Comissão Geológica, Nery Delgado viu a sua atividade interrompida. Devido a dissensões profundas entre os dois diretores, Carlos Ribeiro e Pereira da Costa, a Comissão Geológica foi dissolvida em 1868. No ano seguinte, o ministro das Obras Pública, Joaquim Tomás Lobo d’Ávila restabeleceu a Comissão Geológica com o nome de Secção dos Trabalhos Geológicos. Nery Delgado retomou as suas funções de adjunto e Carlos Ribeiro as de diretor. Em 1882, Nery Delgado tornou-se diretor da secção, após a morte do seu mestre e amigo Carlos Ribeiro. Dirigiu a secção entre 1882 e 1908, tendo criado, em 1883, um dos primeiros periódicos científicos portugueses especializados: Communicações da Secção dos Trabalhos Geologicos. Durante o seu mandato, os serviços geológicos sofreram sucessivas alterações de nome e organização, sem que nunca fossem resolvidos os problemas estruturais que os afetaram, apesar das recomendações de Nery Delgado.

Embora devesse a Pereira da Costa algumas noções de mineralogia e de paleontologia aprendidas na Escola Politécnica e na sede da Comissão Geológica, foi com Carlos Ribeiro que Nery Delgado aprendeu o ofício de geólogo, atribuindo ao trabalho de campo, até aí quase inexistente em Portugal, a importância fundamental que ele tem na prática geológica. 

À data da fundação da Comissão Geológica (1857) Carlos Ribeiro planeara iniciar os trabalhos com vista à publicação de um mapa geológico geral, seguido de mapas de pormenor das regiões representativas dos sistemas geológicos em que os membros da instituição viriam, gradualmente, a especializar-se. No entanto, foi obrigado a mudar de rumo. A falta de uma base topográfica fiável forçou-o a esperar que a Direção dos Trabalhos Geodésicos publicasse um mapa geográfico geral de Portugal que servisse de base ao mapa geológico. Tendo por fundamento o trabalho anteriormente por ele realizado, o reconhecimento geológico de Portugal arrancou em novembro de 1857, na região de Setúbal e províncias do Alentejo e Algarve. No ano seguinte, Nery Delgado deslocou-se ao Minho, tendo utilizado um mapa topográfico desta região da autoria de Sir Nicholas Trant, um brigadeiro do exército português, de ascendência irlandesa, que lutara nas guerras peninsulares. Foi na sequência desta missão que Ribeiro se queixou oficialmente da ausência de mapas geográficos fiáveis, reiterando a queixa em sucessivos relatórios enviados à tutela, nos quais solicitou, repetidamente, a elaboração de um mapa geográfico de Portugal na escala 1:500 000. Este mapa levou cinco anos a ser terminado (1860−1865), obrigando a Comissão Geológica a rever o plano de trabalho inicial. Os dados geológicos entretanto obtidos por Ribeiro e Nery Delgado durante as missões de 1857 foram lançados em folhas da carta corográfica, na escala 1:100 000, publicadas pela Direção Geral dos Trabalhos Geodésicos, sob a orientação de Filipe Folque. Entre 1862 e 1864, Nery Delgado elaborou cartas geológicas sobre as folhas 19 e 20 da carta corográfica (regiões de Óbidos e Lourinhã), mas apenas numa versão aguarelada. Entre abril e setembro de 1867, acompanhou Carlos Ribeiro ao norte de Portugal. Iniciaram a preparação da carta geológica geral de Portugal na escala 1:500 000, da qual foi feita uma primeira versão aguarelada, apresentada na Exposição de Paris de 1867, que lhes valeu uma medalha de prata. Iniciou-se aqui uma prática que se tornou comum: a produção de cartas geológicas de Portugal Continental, na escala 1:500 000 passou a acompanhar o ritmo das exposições universais, onde mapas e outras produções científicas e técnicas eram postas ao serviço da representação do Estado, neste caso com um significado simbólico adicional por se tratar do território. Nestas ocasiões, os serviços geológicos receberam verbas extraordinárias do Estado para intensificar os trabalhos de reconhecimento geológico, revisão e atualização de levantamentos anteriores e custear as despesas de impressão das cartas. A carta de 1867 foi cromolitografada e publicada em duas ocasiões distintas: em 1876, foi impresso um pequeno número de exemplares para a Exposição de Filadélfia; em 1877, apesar de os exemplares terem a data de 1876, foi feita nova impressão com algumas modificações à edição anterior, no que se referia ao Paleozoico do Baixo-Alentejo e à convenção de cores.

Posteriormente, quando o projeto de publicação de uma carta geológica da Europa foi lançado na sessão de 1881 do Congresso Internacional de Geologia, em Bolonha, a Comissão Geológica juntou-se a esta iniciativa. Em colaboração com o geólogo suíço contratado pelos serviços geológicos portugueses, Paul Choffat, Nery Delgado colaborou na elaboração da carta geológica da Europa na escala 1:1 500 000, publicada em Berlim, em 1896, sob a direção de Wilhelm Hauchecorne e Heinrich Ernst Beyrich.

Mais tarde, Delgado e Choffat prepararam uma segunda versão mais precisa da carta geológica de Portugal na escala 1:500 000. Uma versão aguarelada foi apresentada na reunião do Congresso Internacional de Geologia, realizada em Londres em 1888. Esta carta, somente impressa em 1899, ganhou, em 1900, a medalha de ouro na Exposição Universal de Paris, mantendo-se o mapa geológico de referência do território nacional, até 1972.

A obra de Nery Delgado participou nas transformações mais significativas do conhecimento geológico ocorridas no século XIX, com contributos que transcenderam o espaço nacional. Embora bem relacionado com a elite nacional, não são muitos os seus interlocutores portugueses no plano estrito da geologia. Nery Delgado alargou os contactos internacionais iniciados por Carlos Ribeiro. Nos planos institucional e pessoal, envolveu-se numa vastíssima correspondência com especialistas de todo o mundo, já que escrevia bem em francês, a língua franca da ciência da época. De entre os seus inúmeros correspondentes, de diversas nacionalidades, destacam-se: Francisco Tubino, Lucas Mallada, Justo Egozcue y Cia, Juan Vilanova, Manuel Fernandez de Castro, José MacPherson, Hermegildo Giner de los Rios, Eduardo Benot, Charles Barrois, Emile Cartailhac, Gaston de Saporta, Amour Auguste Louis de Berthelot (barão de Baye), Gabriel de Mortillet, Louis Lartet, Frédérique Fontannes, Stanislas Meunier, René Zeiller, Jules Marcou, Oswald Heer, Percival de Loriol, Pietro Zezi, Achille de Zigno, Giovanni Capellini, Gilles Dewalque, Eduard Suess, Wilhelm H. Waagen, Karl Alfred von Zittel, Wilhelm Hauchecorne, Sir Archibald Geikie, Sir Edwin Ray Lankester, Sir John Evans, John Marr, Alfred Nathorst, Otto Torel, George M. Wheeler, Percy Raymond, William B. Rogers, etc.

Paralelamente, foi membro de diversas sociedades científicas estrangeiras, participou institucionalmente em exposições universais e efetuou visitas a diversos países europeus com múltiplos objetivos científicos. Participou, também, nas reuniões do Congresso Internacional de Geologia, organismo criado em 1878, que reunia regularmente com o intuito de normalizar a nomenclatura geológica e as convenções de cores e de sinais a usar na cartografia geológica, bem como de superintender à publicação da carta geológica da Europa. Foi, ainda, membro do Congresso Internacional de Arqueologia e Antropologia Pré-Históricas, então dominado por questões em torno das origens e evolução do Homem.

Nery Delgado viu o seu trabalho reconhecido com diversos louvores e condecorações nacionais e estrangeiras, como por exemplo: Grã-Cruz da Real Ordem de São Bento de Aviz (1905), Medalha Al Merito Cientifico (Academia Real de Ciencias Exactas, Fisicas y Naturales, Madrid, 1905), Grand Prix (Exposition Universelle de Paris, 1900), Officier da Légion d’Honneur (1870), Recompense (Exposition Universelle de Paris, 1867, em parceria com Carlos Ribeiro), louvor de D. Carlos (pela sua carreira, 1905), louvor do Governo Civil de Lisboa (pela participação na Comissão encarregada do estudo das causas da febre tifoide e medidas de saneamento a adotar, 1882), louvor de D. Luís (pelos trabalhos apresentados na IX Sessão do Congresso Internacional de Arqueologia e Antropologia Pré-Históricas, Lisboa, 1880), louvor do conde de Ficalho na qualidade de  diretor do Instituto Geral de Agricultura, (pelo trabalho sobre a arborização geral do país, realizado em parceria com Carlos Ribeiro, 1869). Foi, ainda sócio de diversas associações e agremiações científicas, nomeadamente: Academia das Ciências de Lisboa, Associação dos Engenheiros Civis Portugueses, Sociedade de Geografia, Die Berliner Gesellschaft für Anthropologie, Ethnologie und Urgeschichte (Sociedade de Antropologia, Etnologia e Pré-História de Berlim), Die Kaiserliche-Königliche Geologische Reichsanstalt (Instituto Geológico Imperial), Société Geólogique de France, Société Française d’Archéologie, The Geological Society of London, La Real Academia das Ciências de Madrid, La Real Academia de Ciências Naturales y Artes de Barcelona, La Real Academia Valdarnese del Poggio, Società Geologica Italiana, entre outras.

Além da geologia e cartografia geológica, a obra científica de Nery Delgado abarcou diversas áreas da estratigrafia à paleontologia, passando pela arqueologia, paleoantropologia e geologia aplicada. 

Os trabalhos mais relevantes de Nery Delgado no domínio da geologia centram-se no reconhecimento geral dos terrenos do Paleozoico de Portugal e sua classificação estratigráfica. Publicou, em 1870, as suas primeiras ideias relativas à classificação de estratos do Paleozoico em três notas, a primeira das quais fez uma breve descrição de toda a Era enquanto a segunda e a terceira notas apresentaram um estudo mais pormenorizado dos terrenos metamórficos do “Silúrico”.

Por volta de 1876, concentrou-se no estudo dos xistos contendo Nereites de São Domingos, no Baixo Alentejo, icnofósseis que Nery Delgado classificou como pertencendo ao “Silúrico inferior” (atual Ordovícico). A idade dos xistos do Silúrico tornou-se uma das suas principais preocupações, sobre as quais se correspondeu com diversos especialistas estrangeiros. Reviu este trabalho por duas vezes ao longo da vida. Em resultado disso, a fauna de S. Domingos, inicialmente classificada como sendo do “Silúrico inferior” foi mais tarde deslocada para o “Silúrico superior” (atual Silúrico).

No decurso dos anos 1880, Nery Delgado mostrou-se determinado a esclarecer questões em torno dos icnofósseis do Ordovícico, especialmente os designados por “bilobites” (Cruziana), particularmente abundantes em Portugal. A exemplo do paleontólogo francês Gaston de Saporta, Nery Delgado defendeu a origem vegetal destes fósseis, envolvendo-se numa controvérsia, que se prolongou de 1885 a 1888, com diversos intervenientes, dos quais se destaca o paleontólogo sueco Alfred Nathorst. Este defendia a interpretação atualmente aceite de que estes icnofósseis não são mais do que rastos resultantes da atividade de trilobites, a classe mais primitiva de artrópodes que habitou os mares do Paleozoico.

Dos anos 1890 em diante, Nery Delgado reviu o trabalho anterior relativo ao Câmbrico, Ordovícico e Silúrico do Alentejo, especialmente de Barrancos e São Domingos, mas também de Valongo e do Buçaco. Por volta de 1892, descreveu uma trilobite gigante, encontrada em Valongo, que batizou de Lichas riberoi, em homenagem ao seu mestre. Também anunciou a descoberta de fósseis do Câmbrico em Vila Boim, nas imediações de Elvas, tema a que regressou em 1897.

Em 1904, descreveu a fauna câmbrica do Alto-Alentejo, composta de moluscos, crustáceos e braquiópodes, que considerou estarem entre os primeiros vestígios de vida na Terra. No ano seguinte, dedicou-se à descrição da “fauna primordial” (Câmbrico), revendo as classificações estratigráficas de 1899. Sentiu que devia, por uma última vez, resumir as suas ideias sobre o Paleozoico, pelo que, em 1908, publicou uma monografia, contendo cortes do Silúrico, apresentando argumentos no que se referia aos afloramentos de Valongo e da sua extensão na direção de São Félix, e ainda, os do Buçaco e de Barrancos. Sendo a tectónica de Valongo e do Buçaco particularmente complexa, especialmente na direção de Penacova e de Góis, os estudos prosseguiram por algum tempo, até a morte de Nery Delgado lhes pôr termo.

Na área da arqueologia e antropologia pré-históricas, os trabalhos de Nery Delgado inscreveram-se na preocupação com as origens do Homem, característica da época. Os estudos mais significativos que realizou foram os das grutas da Cesareda, que descreveu em 1867, e o da gruta da Furninha (Peniche), em 1880. A descrição e morfologia desta última foram apresentadas na IX Sessão do Congresso Internacional de Arqueologia e Antropologia Pré-Históricas, realizado em Lisboa, em 1880, por iniciativa de Carlos Ribeiro e do próprio Nery Delgado. 

Ao privilegiar uma abordagem de base científica, caracterizada pela convergência da estratigrafia, paleontologia e paleoantropologia, Nery Delgado, apesar da obra científica quantitativamente reduzida, deu um contributo importante para fazer sair a arqueologia e a paleoantropologia da esfera das práticas do colecionador-antiquário. Como os métodos estratigráficos que utilizou não diferiram substancialmente dos atuais, os resultados da investigação alcançados neste domínio ainda hoje são aceites.

No que se refere à geologia aplicada, área que não o entusiasmava especialmente, desde o início da sua carreira na Comissão Geológica que Nery Delgado acompanhou Carlos Ribeiro em trabalhos associados à exploração de minas e pedreiras e à hidrogeologia. Mesmo durante a suspensão da Comissão Geológica do Reino, em 1868, mestre e discípulo foram solicitados, dado o seu conhecimento do território, a efetuar o estudo que conduziu ao relatório sobre a arborização do país, ainda hoje uma obra de referência.

À época, a hidrogeologia revestia-se de especial importância, pois veio possibilitar a prospeção, canalização e abastecimento de águas potáveis às populações citadinas, uma prioridade das teorias higienistas desenvolvidas ao longo do século XIX. Neste domínio, Nery Delgado acompanhou Carlos Ribeiro nos estudos e obras associados ao abastecimento de água a Lisboa e a outras localidades como a Figueira da Foz e Beja. Também interveio nas áreas da construção civil, portos e caminhos de ferro, embora neste último caso, se limitasse a acudir a problemas pontuais, já que, em Portugal, eram raros os estudos geológicos preliminares a obras desta índole. Inspetor-geral de Minas, a partir de 1886, foi ainda consultado sobre a atividade mineira e a exploração de pedreiras.

Em 1908, Nery Delgado, então com 73 anos e a patente de general de divisão, sucumbiu a uma pneumonia dupla, durante uma saída de campo, na região do Buçaco.

Ana Carneiro

Arquivos

Lisboa, Arquivo Histórico do Laboratório Nacional de Energia e Geologia, publicações, manuscritos, cadernos de campo, cadernos de apontamentos, correspondência nacional e internacional, mapas, gravuras, fotografias e memorabilia

Lisboa, Arquivo Militar, documentos relativos à sua carreira militar

Lisboa, Museu Geológico, coleções paleontológicas, litológicas e arqueológicas, instrumentos científicos e condecorações.

Obras 

Nery Delgado, Joaquim e Paul Choffat, Carta Geológica de Portugal. Escala 1:500 000. Lisboa: Direção dos Trabalhos Geológicos, 1899.

Nery Delgado, Joaquim. “As Aguas de Bellas. Reflexões acerca do artigo ‘As Aguas de Lisboa’, publicado no vol. 24 d’esta Revista.” Revista de Obras Publicas e Minas 25 (1894): 72–81.

Nery Delgado, Joaquim. “Relatórios sobre a Reorganisação dos Serviços Geológicos Apresentados ao Ministro das Obras Publicas em 1899.” Communicações do Serviço Geológico de Portugal 7 (1909): 168–186.

Nery Delgado, Joaquim. Da Existência do Homem no nosso Solo em Tempos Mui Remotos provada pelo Estudo das Cavernas – Noticia Acerca das Grutas da Cesareda. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1867.

Nery Delgado, Joaquim. errains Paléozoïques du Portugal. Études sur les Bilobites et Autres Fossiles de Quartzites de la Base du Système Silurique du Portugal. Lisboa: Imprimerie de l’Académie Royale des Sciences, 1885.

Nery Delgado, Joaquim. Relatorio da Commissão Desempenhada em Hespanha no anno de 1878. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1879.

Nery Delgado, Joaquim. Relatorio e outros Documentos Relativos à Commissão Scientifica Desempenhada em Differentes Cidades da Italia, Allemanha e França em 1881. Lisboa: Imprensa Nacional, 1882.

Nery Delgado, Joaquim. Système Silurique du Portugal. Étude de Stratigraphie Paléontologique. Lisboa: Imprimerie de l’Académie Royale des Sciences, 1908.

Nery Delgado, Joaquim. Terrains Paléozoïque du Portugal. Sur l’Éxistence du Terrain Silurien dans le Baixo-Alemtejo, Mémoire présenté à l’Académie Royale des Sciences de Lisbonne. Lisboa: Imprimerie de l’Académie Royale des Sciences, 1876.

Ribeiro, Carlos e Joaquim Nery Delgado. Relatório acerca da Arborisação Geral do Paiz apresentado a Sua Excelência o Ministro das Obras Publicas, Commercio e Industria, em resposta aos quesitos do artº 1 do Decreto de 21 de Setembro de 1867. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1868.

Bibliografia sobre o biografado

Carneiro, Ana. “The Museum of the Geological Survey of Portugal: The Role of the ‘Bilobites’ Collection in a 19th-century Palaeoichnological Controversy.” In From Private to Public, Natural Collections and Museums, edited by Marco Beretta, 189-234. Nova York: Science History Publications, 2005.

Carneiro, Ana, Teresa Salomé Mota e Vanda Leitão. O Chão que Pisamos. A Geologia ao Serviço do Estado (1848–1974). Lisboa: Edições Colibri, 2014.

Catalá-Gorgues, Jesús e Ana Carneiro. “Like birds of a feather: the cultural origins of Iberian geological cooperation and the European Geological Map of 1896.” The British Journal for the History of Science 46 (2013): 39–70. 

Choffat, Paul. “Notice Nécrologique sur J. F. Nery Delgado (1835–1908).” Communicações do Serviço Geológico de Portugal 7 (1909): VI–XXI.Teixeira, Carlos. “A Figura e Obra de Nery Delgado.” Boletim da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais 12 (1968–1969), 45–54

Choffat, Léon-Paul

Porrentruy, Suíça, 14 março 1849 — Lisboa, 6 junho 1919

Palavras-chave: Mesozoico, cartografia geológica, geologia aplicada, tectónica.

DOI: https://doi.org/10.58277/UYCS1979

Léon-Paul Choffat nasceu no seio de uma família abastada, filho de Marie Anne Jeanne Baptiste Béchaux (1812−1881) e de Henri Joseph Choffat (1797−1869), banqueiro e industrial. Durante a infância, era visita da casa paterna o naturalista e iniciador da tectónica do Jura, Jules Thurmann, discípulo de Élie de Beaumont. Choffat foi diretamente influenciado por dois alunos de Thurmann, Jean-Baptiste Thiessing e Joseph Ducret, então professores da Ecole Cantonale de Porrentruy, onde se matriculou em 1861, acompanhando-os em excursões geológicas. Após terminar a educação secundária, foi enviado para Besançon para adquirir a formação necessária a uma carreira na banca; simultaneamente, frequentou a Faculdade de Ciências local. Foi nesta altura que se tornou sócio da Société d’Emulation du Doubs, uma associação promotora desta região francesa, vindo a publicar trabalhos sobre a geologia da região do Jura nas respetivas Mémoires, entre 1875 e 1879.

Regressado da estadia de três anos em França, Choffat ingressou, em 1871, na Escola Politécnica e na Universidade de Zurique, onde frequentou cursos de química e de ciências naturais. O falecimento de seu pai, aliado à fortuna pessoal herdada e à influência do arqueólogo e historiador da região, Auguste Quiquerez, e do médico e geólogo, Jean Baptiste Greppin, levaram-no a seguir a sua vocação de geólogo, agora sem constrangimentos. Durante este período, beneficiou do regime de aulas de campo de Arnold Escher von der Linth e Albert Heim, figuras de relevo na geologia suíça, e Heim na sua institucionalização. Na universidade e, mais tarde, nas expedições pelos Alpes, na região do Jura, Choffat relacionou-se com Ludwig von Loczy, Oswald Heer, que viria a colaborar com os serviços geológicos portugueses, Karl Mayer-Eymar e Jules Marcou. Depois de concluir os estudos superiores na Universidade de Zurique, em 1875, foi nomeado Privatdozent, na Escola Politécnica local para os cursos de geologia e paleontologia animal, lecionando também na Faculdade de Medicina; porém, rapidamente deixou a docência devido a uma laringite crónica, sendo aconselhado a mudar-se para um clima mais ameno. Em resultado das investigações realizadas no Jura francês e na região de Berna, tinha já publicados diversos trabalhos, em França e na Suíça, quando, em 1878, se deslocou a Paris para a primeira reunião do Congresso Internacional de Geologia (CIG).

A atividade científica de Choffat decorreu num período de franco desenvolvimento da geologia, então já em fase de profissionalização e especialização. Desde meados da década de 1830, tinham sido criados nos diversos países, incluindo Portugal, instituições estatais destinadas ao levantamento geológico e à elaboração de cartografia geológica, decorrentes da necessidade de controlar o território para melhor o administrar. A exploração de recursos minerais e hidrológicos intensificou-se dada a sua utilização em importantes sectores económicos como a produção industrial, enquanto matérias-primas e combustíveis, construção civil, agricultura, abastecimento de águas potáveis e exploração de águas mineromedicinais. Sendo a geologia uma ciência territorial que comporta uma dimensão histórica e tendo as unidades geológicas, frequentemente, um carácter transnacional, nela convergiram tensões entre nacionalismo e internacionalismo, numa época em que a ciência e a tecnologia se tornaram argumentos decisivos na afirmação da supremacia das diversas potências europeias. Estas tensões ficaram bem patentes nas reuniões do CIG, fórum internacional que reunia periodicamente com o intuito de normalizar a linguagem verbal e visual da geologia, em matéria de divisões cronostratigráficas e respetiva nomenclatura e do código de cores a usar na cartografia geológica, a última adquirindo um carácter simbólico ao integrar a parafernália de símbolos nacionais. 

Foi, precisamente, na reunião do CIG de 1878 que Choffat travou conhecimento com Carlos Ribeiro, então diretor da Secção dos Trabalhos Geológicos, organismo do Ministério da Obras Públicas, Comércio e Indústria, que tinha por missão o levantamento geológico de Portugal continental e a produção de cartografia geológica. Ribeiro convidou Choffat a colaborar com a instituição portuguesa não só para que este realizasse o estudo do Mesozóico, até aí inexplorado devido à falta de especialistas em Portugal, mas também fortalecesse a estratégia de internacionalização dos serviços que chefiava. Choffat, por seu turno, estava simultaneamente interessado em passar algum tempo num clima mais suave e em investigar a geologia de Portugal, o que lhe garantiria uma produção original e sem concorrência, facilitando a sua projeção na comunidade científica internacional. 

Choffat esboçou um programa de trabalho e negociou modos de prevenir conflitos, assegurando-se de que não haveria sobreposição com trabalho de colegas portugueses, ao mesmo tempo que clarificou questões de propriedade intelectual e dos fósseis a recolher, propondo-se ser um colaborador temporário, a título gratuito. Ribeiro respondeu favoravelmente ao plano e Choffat veio para a Lisboa. A correspondência endereçada à Secção dos Trabalhos Geológicos dá indicações acerca das suas atividades no ano e meio seguinte e da rede de contactos que tinha na Suíça e em França.

Choffat chegou a Portugal em Novembro de 1878, passando os últimos dois meses deste ano a examinar a coleção de fósseis da Secção; em Janeiro de 1879, foi-lhe oficialmente requerido que estudasse as formações do Mesozóico. Bem integrado, gozava de uma autonomia significativa, cedo desempenhando um papel ativo na instituição, pois apercebeu-se das limitações existentes, nomeadamente da sua reduzida dimensão e falta de recursos bibliográficos, estabelecendo contactos com livreiros estrangeiros, no sentido de adquirir obras atualizadas para a modesta biblioteca.

As investigações sobre o Mesozóico resultaram na colheita de fósseis cuja descrição e classificação requereram colaboração externa. No início de 1880, decidiu contactar Heer, reputado especialista na flora do Terciário, que se mostrou interessado nos seus achados e se prontificou a auxiliá-lo, mas no quadro de uma colaboração formalizada com a Secção dos Trabalhos Geológicos. Como Ribeiro não conhecia Heer, Choffat funcionou como intermediário entre ambos e, mais tarde, com outros especialistas: o paleontólogo suíço Perceval de Loriol, e o cristalógrafo e mineralogista austríaco Gustav Adolph Kenngot que colaboraram com os serviços geológicos portugueses. 

A estadia de Choffat em Portugal produziu resultados capazes de contribuir para a consolidação da sua posição no panorama científico internacional e a confiança nele depositada levou Ribeiro a investi-lo de responsabilidades de diplomacia científica. Quando se deslocou a Paris, em Junho de 1880, para apresentar um trabalho na Société Géologique de France sobre as investigações do Jurássico realizadas em Portugal usou a oportunidade para, a pedido de Ribeiro, auscultar a disponibilidade dos colegas de viajarem até Lisboa para o Congresso de Arqueologia e Antropologia Pré-histórica que teve lugar nesse mesmo ano. 

A sua primeira estadia em Portugal terminou, em 1880, ano em que regressou a Porrentruy para depois casar, em Besançon, com Jeanne Claudette Logerot (1859−1928) de quem teve nove filhos. Embora à data mantivesse o lugar de professor em Zurique, manifestou a Ribeiro o desejo de voltar a Portugal. Entretanto, o ano de 1882 é marcado pela morte deste, sucedendo-lhe na direção da Secção dos Trabalhos Geológicos, Joaquim Filipe Nery da Encarnação Delgado, que seguiu orientações idênticas no que se referia à colaboração externa, dado o reduzido pessoal dos serviços e a inexistência de uma comunidade local de geólogos. 

Choffat regressou definitivamente a Portugal, em 1883, começando a trabalhar para o governo português, na Secção dos Trabalhos Geológicos, sob contrato sucessivamente prorrogado até à sua morte. Nesse mesmo ano, iniciou-se a publicação da primeira revista portuguesa especializada em geologia, as Comunicações da Secção dos Trabalhos Geológicos, denotando a capacidade da instituição de produzir, regularmente, investigação científica. 

A produção científica de Choffat foi vasta, abrangendo diversas disciplinas da geologia, ou com ela relacionadas: estratigrafia e paleontologia do Mesozoico, cartografia geológica, tectónica, sismologia, geologia económica, hidrogeologia, paleoantropologia e arqueologia. Entre 1880 e 1885, publicou sobre o Lias (Jurássico Inferior) e Dogger (Jurássico Médio), a Norte do Tejo, e sobre o Cretácico nas regiões de Lisboa, Sintra e Belas. Como era então comum, dividiu o Jurássico em Lias, Malm (Jurássico Superior) e Dogger, estando entre os primeiros geólogos europeus a defender a separação do Calloviano do Jurássico Superior e a colocá-lo no Dogger. Em 1882, apresentou à Société Géologique de France uma nota sobre estruturas diapíricas em Portugal que designou vales tifónicos, assunto sobre o qual publicou nos dois anos seguintes. Neste período, teve ainda assento nas comissões de nomenclatura geológica, lideradas pela Secção dos Trabalhos Geológicos, no âmbito do CIG. 

Com a reestruturação de 1886, a Secção dos Trabalhos Geológicos passou a denominar-se Comissão dos Trabalhos Geológicos, dissociando-se da Direcção-Geral dos Trabalhos Geodésicos, em fase de declínio, ficando formalmente ligada ao sector mineiro pela sua integração na Direcção-Geral das Obras Públicas e Minas. A partir de então, a Comissão passou a ser obrigada a recrutar o seu pessoal entre os engenheiros de minas já ao serviço do Ministério das Obras Públicas, certamente para poupar verbas e satisfazer esta já bem posicionada clientela. De salientar que somente Choffat e depois Wenceslau de Lima, ambos no regime de contratados, tiveram o título de geólogo, facto indicativo de que o estatuto profissional dos engenheiros prevalecia sobre o dos geólogos no seio da instituição, situação que se prolongou pelas primeiras décadas do século XX.

De 1885 em diante, Choffat prosseguiu com investigações sobre o Cretácico e o Jurássico, corrigindo interpretações de Ribeiro. Apesar de este ter definido as principais características geológicas do território antes de 1860, os seus conhecimentos sobre as faunas e floras do Cretácico e do Jurássico estavam, naturalmente, limitadas pelo conhecimento da época, o que explica que não tenha podido caracterizar o Bathoniano (Jurássico Médio), o Senoniano (Cretácico Superior), hoje em desuso, e estabelecer os contactos do Jurássico com o Triásico. Choffat localizou os depósitos bathonianos e estabeleceu a estratigrafia pormenorizada de todos os andares do Jurássico, descrevendo a sua fauna em Portugal. Propôs a criação do andar Lusitaniano (1885 e 1893) para o conjunto estratigráfico Oxfordiano Superior – Kimmeridgiano, localizado no Jurássico, o que foi temporariamente aceite. Embora nunca se tenha deslocado a África, desenvolveu, entre 1886 e 1889, estudos de geologia das colónias portuguesas neste continente, analisando amostras e notas enviadas por diversos viajantes. 

Em 1887, Choffat solicitou que nos trabalhos de levantamento geológico auferisse de ajudas de custo para o serviço de campo iguais às dos engenheiros de minas, alegando ser mais antigo no serviço do governo português do que o primeiro classificado dos engenheiros subalternos, pretensão despachada favoravelmente. No ano seguinte, requereu que o seu vencimento de 60 mil reis fosse equiparado ao dos engenheiros chefes de minas, no valor de 100 mil reis; no entanto, foram-lhe apenas abonados 90 mil reis

Neste período, a produção científica da Comissão dos Trabalhos Geológicos assentava, fundamentalmente, nos trabalhos de Choffat e de Delgado, recorrendo-se novamente a colaborações estrangeiras, em certos casos facilitadas por Choffat. É o caso de Loriol que analisou as faunas do Cretácico e do Jurássico, em 1888, e, posteriormente, em 1890 e 1896. Mais uma vez, os serviços geológicos foram reestruturados, em 1892, passando a designar-se Direção dos Trabalhos Geológicos, continuando Nery Delgado a gerir os seus destinos. 

No plano da cartografia, Choffat e Nery Delgado baseados na carta geológica de Portugal de 1876, na escala de 1:500 000, apresentaram os esboços da revisão desta carta, nas reuniões do CIG de Londres (1888) e de Zurique (1894), publicando uma nova versão, em 1899, que foi premiada com uma medalha de ouro, na Exposição Universal de Paris de 1900. Em conjunto com Nery Delgado, Choffat colaborou na elaboração do Mapa Geológico de España, na escala 1: 400 000 (folhas 5, 9 e 13), publicada em 1889, e na edição de 1893 do Mapa Geológico de España (representando a Península Ibérica), na escala 1: 1 500 000, ambos sob a direção de Manuel Fernandez de Castro. Contribuíram, também, para as folhas 29 AV e 36 AVI da carta geológica da Europa, na escala 1: 500 000, publicada em Berlim, em 1896, uma iniciativa do CIG coordenada pelo prussiano Wilhelm Hauchecorne. Choffat elaborou uma carta geológica de Portugal do ponto de vista agrícola, na escala de 1: 2 000 000, publicada em 1901. Em colaboração com Luís de Almeida Couceiro, funcionário dos serviços geológicos, elaborou uma carta hipsométrica de Portugal, na escala de 1:100 000 publicada em 1900, com uma nota explicativa, em 1907. Trabalhou, ainda, nos mapas geológicos de Sintra, na escala 1: 20 000; Buarcos, na escala 1: 100 000, e Arrábida, na escala 1: 25 000, com a colaboração de Romão de Matos (1880−1979), um dos auxiliares de trabalho de campo (então denominados coletores) mais proficientes. 

Em 1899, a Direção dos Trabalhos Geológicos foi reestruturada, passando a designar-se Direção dos Serviços Geológicos, deixando o vencimento de Choffat de estar inscrito no orçamento geral, para passar a sair da verba “despesas diversas.” Consequentemente, ficou sem financiamento para ajudas de custo referentes a trabalho de campo e a publicações, sendo o seu vencimento reduzido para 76 500 reis, facto surpreendente, tendo em conta a sua carreira e prestígio. Em 1901, na sequência de mais uma reorganização, a anterior Direção passa a Comissão do Serviço Geológico.

Choffat, agora detentor de um conhecimento aprofundado da geologia do país, reviu divisões estratigráficas anteriormente estabelecidas. Trabalhou, principalmente, o Cretácico Superior e os contactos entre o Jurássico e o Cretácico. Relativamente ao Cretácico, reviu interpretações e distinguiu quatro grupos: o grupo hoje em desuso Neocomiano (Cretácico Inferior), o Belasiano (uma antiga divisão entre o Cretácico Médio e Inferior, cujo nome deriva de Belas, localidade próxima de Lisboa), o Turoniano (Cretácico Médio), e o Senoniano (Cretácico Superior). Na sequência dos sismos registados no país em 1903 e 1909, publicou trabalhos neste domínio, tendo representado Portugal na Associação Internacional de Sismologia; em 1908, publicou um estudo sobre a tectónica da Serra da Arrábida. 

Na área da hidrogeologia realizou, entre 1893 e 1903, estudos relacionados com o abastecimento de água a Lisboa, Guimarães, Beja e Guarda, e sobre as águas minerais dos terrenos mesozoicos e do soco paleozoico.

Desde os finais do século XIX que, no decurso de trabalhos de terraplanagens, abertura de poços ou pesquisa de águas, se registaram ocorrências de hidrocarbonetos (petróleo, asfalto e betume) nos terrenos mesozoicos portugueses a norte do Tejo. Rapidamente se difundiu a notícia da existência de petróleo em Portugal, numa altura em que a exploração de jazidas deste combustível fóssil adquiria cada vez maior importância em diversos países. Desde 1902 que Choffat fora solicitado por privados a realizar estudos sobre locais onde parecia existirem indícios de petróleo. Os resultados destes estudos foram publicados em 1910, concluindo o geólogo ser inegável a existência de petróleo nas formações mesozoicas portuguesas da região de Torres Vedras e Monte-Real. Aproveitou a ocasião para chamar a atenção para a necessidade de realização de estudos geológicos preliminares a sondagens, de modo a aumentar a eficácia, reduzir o risco de insucesso e os custos; considerava que o Estado português deveria intervir na pesquisa e exploração dos hidrocarbonetos, uma atividade industrial promissora em termos económicos. Entre 1912 e 1914, Choffat elaborou relatórios sobre as areias auríferas da Adiça e outros depósitos da costa ocidental da Península de Setúbal, as jazidas de ferro do Triásico e dos xistos paleozoicos das zonas de Pias e Alvaiázere e as minas de granadas de Monte Suímo, em Sintra.

Ainda no que se refere à geologia aplicada, publicou sobre a importância dos dados geológicos prévios à construção de caminhos-de-ferro, prática corrente na Suíça, e a construção de uma ponte sobre o Tejo, em Lisboa. De entre estes trabalhos, destaca-se o estudo geológico dos terrenos onde foi construído o túnel do Rossio, publicado em 1889. Além do seu significado científico, esta obra visou ser uma demonstração da necessidade de estudos geológicos preliminares a obras públicas, demarcando o espaço de competência profissional do geólogo, face ao engenheiro civil. No entanto, o principal beneficiário deste estudo foi Edmond Bartissol, o empreiteiro francês responsável pela obra inaugurada em Junho de 1890, que pôde assim escolher o método de perfuração mais económico. Choffat, no entanto, advogava um traçado do túnel ligeiramente diferente, alegando que este pouparia ao Estado quantia considerável, mas nem a Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses, nem a Direcção-Geral ou o Ministério da Obras Públicas, lhe solicitaram qualquer estudo prévio à adjudicação da obra, talvez por entenderem que este seria uma mera formalidade burocrática.  

Finalmente, Choffat publicou diversos obituários de geólogos portugueses e de estrangeiros que trabalharam sobre temas geológicos referentes ao território nacional, contribuindo para a construção de uma memória da geologia, em Portugal.

Com a morte de Nery Delgado, em 1908, sucedeu-lhe Wenceslau de Lima cujo mandato foi efémero. Choffat foi instado a suceder-lhe, mas recusou por se sentir fisicamente debilitado. Lamentou a falta de quadros competentes, dadas as deficiências no ensino da geologia em Portugal e a aversão ao trabalho de campo que já anteriormente criticara. Choffat não deixou discípulos; apenas alguns coletores e o capitão de engenharia do quadro de minas do Ministério das Obras Públicas, Francisco Luís Pereira de Sousa, terão beneficiado da sua experiência e conhecimentos. A 6 de Junho de 1919, Choffat morreu, em Lisboa, ficando provisoriamente sepultado no jazigo de Nery Delgado, no Cemitério dos Prazeres, tendo sido posteriormente transladado para o seu mausoléu, no cemitério de Porrentruy. 

Cada vez mais crítico do rumo que a instituição tomara, sobretudo após o falecimento de Nery Delgado, terá sido sua intenção doar parte da biblioteca pessoal a sociedades científicas francesas e belgas; a um seu sobrinho, estudante de geologia, as obras referentes à Suíça e o remanescente à Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra. Quanto às suas notas de campo e outros manuscritos, foram levados pelos herdeiros para a Suíça. Este espólio só regressaria a Portugal, em 1947, sendo posteriormente devolvido aos serviços geológicos.

A obra de Choffat foi reconhecida e objeto de distinções variadas. Foi homenageado através da nomenclatura paleontológica, sendo longa a lista de táxones que lhe são dedicados. Em 1892, foi-lhe conferido o doutoramento honoris causa pela Universidade de Zurique, e o grau de Comendador da Ordem de Isabel la Católica, em 1896, pela colaboração com a Comisión del Mapa Geológico de España; em Portugal, recebeu o mesmo grau da Ordem de S. Tiago. Em 1900, foi galardoado com o Prémio Auguste Viquesnel da Société Géologique de France, pela primeira vez atribuído a um estrangeiro. Foi membro de inúmeras academias e sociedades científicas portuguesas e estrangeiras.

Ana Carneiro

Arquivos

Arquivo Histórico e Biblioteca do LNEG – Laboratório Nacional de Energia e Geologia: notas manuscritas, correspondência, minutas de campo, cartografia e publicações científicas (espólio não organizado, guardado em caixas diversas).

Biblioteca do Departamento de Ciências da Terra da Universidade de Coimbra, 

Núcleo Paul Choffat (1849–1919).

Obras 

Choffat, Paul. “Études Géologiques sur la Chaîne du Jura. I– Esquisse du Callovien et de l’Oxfordien dans le Jura Occidental et le Jura Méridional suivie d’un Supplément aux Couches à Ammonites Acanthicus dans le Jura Occidental.” Mémoires de la Société d’Émulation du Doubs, 3 (1879): 72–219.

— Etude Stratigraphique et Paléontologique des Terrains Jurassiques du Portugal: Première Livraison – Le Lias et le Dogger au Nord du Tage. Lisbonne: Section des Travaux Géologiques/Imprimerie de L’Académie Royales des Sciences, 1880.

Étude Géologique du Tunnel du Rocio. Contribution à la Connaissance du Sous-sol de Lisbonne. Lisbonne: Commission des Travaux Géologiques du Portugal/ Imprimerie de l’Académie Royale des Sciences, 1889.

— “Les Eaux d’Alimentation de Lisbonne. Rapport entre leur Origine Géologique et leur Composition Chimique.” Bulletin de la Société Belge de Géologie, Paléontologie et Hydrologie, 10 (1896): 161–197.

— “L’Infralias et le Sinémurien du Portugal.” Comunicações da Comissão do Serviço Geológico de Portugal, 5 (1903): 49–113.

Contributions à la Connaissance Géologique des Colonies Portugaises d’Afrique. I – Le Crétacique de Conducia. Lisbonne: Commission du Service Géologique du Portugal/ Imprimerie de l’Académie Royale des Sciences, 1903.

Essai sur la Tectonique de la Chaîne de l’Arrabida. Lisbonne: Commission du Service Géologique du Portugal/Imprimerie Nationale, 1908.

—“Le Séisme du 23 Avril 1909 dans le Ribatejo (Portugal) et ses Relations avec la Nature Géologique du Sol.” In Comptes Rendus des Séances de la Troisième Réunion de la Commission Permanente de l’Association Internationale de Sismologie, Réunion à Zermatt, du 30 Août au 2 Septembre, edited by R. Kövesligethy, 126–129. Budapest: Victor Hornyánszky, 1910. 

— “Rapports de Géologie Économique. 3– Les Recherches d’Hydrocarbures dans l’Estremadure Portugaise (Résumé). 4– Les Mines de Grenats de Suimo.” Comunicações da Comissão do Serviço Geológico de Portugal, 10 (1914): 159–198.

Delgado, Joaquim Filipe Nery e Paul Choffat. Carta Geológica de Portugal. Escala 1:500 000. Direção dos Trabalhos Geológicos, 1899.

Bibliografia sobre o biografado 

Areias, Maria das Dores, “Expeditions in the African Colonies during then 19th century: Geological Contributions from Portuguese Travellers.” Comunicações do Instituto Geológico e Mineiro, 88 (2001): 347–354.

Carneiro, Ana, Teresa Salomé Mota e Vanda Leitão. O Chão que Pisamos. A Geologia ao Serviço do Estado (1848–1974). Lisboa: Edições Colibri /Colecção CIUHCT, 2014.

Fleury, Ernest. “Une Phase Brillante de la Géologie Portugaise: Paul Choffat, 14 Mars 1849–6 Juin 1919.” Mémoires de la Société Portugaise des Sciences Naturelles, 3 (1920): 1–54.

Rocha, Rogério Bordalo da, et al. (eds). Paul Choffat na Geologia Portuguesa. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa /Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação, 2008.

Teixeira Pinto, Luís. “Paul Choffat’s First Stay with the Portuguese Geological Survey.” Comunicações do Instituto Geológico e Mineiro, 88 (2001): 301–308.